
Você deve ter visto no feed do seu Instagram a nova trend de imagens geradas pelo ChatGPT – as fotos transformadas em desenhos inspirados no Studio Ghibli. Com essa nova moda das redes sociais, o chatbot da OpenAI teve um pico de utilizações, e ultrapassou 500 milhões de usuários e esse número gerou um novo debate entre entusiastas de tecnologia e sustentabilidade – quanto de água é necessário para criar todas essas fotos? Conversamos com Rafael Astuto, gerente executivo de engenharia de vendas da Ascenty, para entender como funciona o consumo de água em data centers.
Um estudo da Universidade da Califórnia mostrou que para realizar de 20 a 50 consultas é gasto aproximadamente meio litro de água doce. A instituição de ensino estimou a pegada hídrica a partir da execução de pesquisas em IAs que dependem de computação em nuvem, situadas em racks de data centers. Segundo Rafael, o consumo de água de grandes empresas, principalmente as de Inteligência Artificial, nem sempre está atrelado aos grandes centros de processamento de dados utilizados por essas companhias.
“Quando fazemos a analogia de que ao fazer uma pergunta para o ChatGPT, eu consumo um determinado volume de água, isso não significa que necessariamente esse consumo está ligado ao data center, propriamente dito. Isso está relacionado com a matriz energética com a qual nós geramos energia para que o data center funcione. O Brasil hoje tem um diferencial estratégico muito grande em relação aos Estados Unidos e principalmente à Europa, que é relativo à nossa matriz energética. Então hoje mais de 85% da nossa matriz energética é renovável, que se divide entre a matriz hídrica, eólica, biomassa, solar e nuclear”, afirma o executivo.
Além disso, ele explica que a fatia da participação das hidrelétricas na geração de energia tem diminuído – e aumentado a da eólica, que de acordo com dados do Sistema de Informações de Geração, da Agência Nacional de Energia Elétrica, já representa cerca de 13,5% da matriz nacional.
“Então, quando a gente fala que há um consumo de água, não significa que necessariamente é aquele consumo de água direto na operação do data center, mas quanto de água precisei utilizar para gerar aquela quantidade de energia, para poder alimentar os meus servidores, os meus equipamentos e com isso fazer com que o sistema de inteligência artificial funcione”, afirma Astuto.
Mas onde entra a água no funcionamento do ChatGPT?
Com toda a tecnologia, fios e racks dentro dos data centers, chega a ser confuso imaginar onde entra o consumo de água nessa operação. E é até difícil pensar para onde ela vai quando tudo termina. O uso de água da IA percorre 3 escopos: no local, para resfriamento do data center; fora do local para geração de eletricidade; e água da cadeia de suprimentos, para fabricação de servidores.
O especialista explica que nos grandes centros de operação de dados, como o da Ascenty, a água é utilizada no processo na absorção e dissipação de calor dos aparelhos eletrônicos, em um processo chamado de liquid cooling ou resfriamento líquido. No entanto, muitos centros de dados já aderiram aos circuitos fechados de resfriamento, nos quais a água é necessária apenas para dar início a operação, e então fica presa na tubulação, sem necessidade de substituição, conforme explica Astuto. Esse processo, além de sustentável, é mais eficiente do ponto de vista energético.
“Os data centers hoje são muito eficientes, porque, atualmente, existem diversas tecnologias muito mais avançadas do que 15 a 20 anos atrás, em termos de refrigeração. Os computadores geram muito calor e a gente precisa tirar esse calor de dentro do datacenter através do sistema de climatização. Na Ascenty, em especial, utilizamos máquinas de ar-condicionado que utilizam circuitos fechados de água, sem aquelas torres de resfriamento, que a gente vê aquele vapor de água saindo pela torre. Ou seja, a água que eu coloquei no início da operação do datacenter é a mesma água que vai ser utilizada até o fim da vida útil desse data center”, explica o executivo.
Pegada de carbono também é preocupação do setor
O consumo de energia e a emissão de gases de efeito estufa, como o CO2, também são uma preocupação para especialistas do setor, e segundo Astuto, já existe uma movimentação dos data centers, principalmente nos Estados Unidos, para diminuir a pegada ambiental das operações.
A luz nesses problemas vem, justamente, das expectativas do mercado sobre o consumo de energia. Um estudo da revista científica Joule, assinado por Alex de Vries, mostra que a IA global poderia consumir de 85 a 134 terawatts-hora (TWh) de eletricidade em 2027 – número 2,4 vezes maior do que o consumo de energia elétrica da cidade de São Paulo (26,91 TWh ao ano).
“O mercado de data centers já está se movimentando nesse sentido. Quando a gente vai para os Estados Unidos, que hoje concentra a maior quantidade de centros de dados no mundo, o consumo de energia desse mercado hoje já supera a faixa de 5%, podendo chegar a 6% de todo o consumo de energia nos Estados Unidos. O que tem sido desenvolvido, justamente para diminuir essa pegada ambiental, é a reativação de usinas nucleares e o desenvolvimento de pequenos reatores nucleares”, explica Astuto.
O especialista ainda afirma que no Brasil, o investimento em soluções como essas é contra intuitivo, principalmente levando em consideração que nossa matriz energética já é 90% composta por elementos renováveis. De acordo com Rafael, ao investir em eficiência energética, empresas conseguem reduzir significativamente o consumo de eletricidade — o que, no caso do Brasil, diminui também a dependência da matriz hídrica. Esse princípio vale, por exemplo, para os datacenters, que demandam grandes volumes de energia para resfriamento.
Assim como nas usinas nucleares, que utilizam água do mar ou de rios para controlar a temperatura dos reatores, muitos datacenters adotam soluções semelhantes. Nos Estados Unidos, há centros de dados construídos dentro de montanhas que aproveitam lagos subterrâneos e lençóis freáticos para a troca de calor, otimizando o uso de recursos naturais e aumentando a sustentabilidade da operação.
“É importante ressaltar que você não está consumindo essa água, você não está poluindo ou mudando a qualidade e o pH, nem injetando algum tipo de químico nela. Você simplesmente está utilizando essa água para trocar calor. Ela entra fria, rouba calor do meio ambiente e retorna mais quente. E esse ciclo, ele continua ali de maneira virtuosa, sem qualquer prejuízo para o meio ambiente”, confirma.
Para aliviar o peso na consciência, ou ficar mais preocupado com a pegada de carbono, Rafael Astuto explica que a geração de imagens ou textos por meio do ChatGPT não são a única forma de emitir gases de efeito estufa dentro de casa. “Se pararmos para pensar, toda fonte de energia que nós geramos tem a sua pegada de carbono – todo o nosso dia a dia hoje, desde ligar uma televisão, o computador, carregar o celular, abastecer o carro no posto de gasolina, carregar o carro elétrico na tomada – tudo isso que a gente faz, tem uma pegada de carbono. É natural que isso aconteça”, finaliza.
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