* Por André Ramos
“Quem foi o responsável por essas desastrosas projeções financeiras?” Assim começou o feedback da minha primeira participação em uma competição de empreendedorismo, no extinto Desafio GV-Intel, promovido pela Fundação Getúlio Vargas e pela Intel. Deu um frio na barriga. Na época, questionei a minha capacidade, já pensando que aquilo não seria para mim. No entanto, depois de baterem, veio o “assopro”. Os feedbacks saíram da parte financeira e chegaram na parte técnica e, então, vieram os elogios. Ao final do evento, valeu a pena, sem dúvidas.
Hoje, reconheço que ouvir críticas é fundamental para o desenvolvimento empreendedor. Entretanto, é muito frequente receber feedbacks “sem pé nem cabeça”. Por isso, é importante tomar nota de tudo e refletir muito para separar os bons conselhos. Mesmo os melhores especialistas podem errar. Mark Cuban, apresentador do Shark Tank norte-americano e dono da equipe de basquete Dallas Mavericks, por exemplo, amarga ter recusado investir no Uber, acreditando que o negócio seria um fracasso.
Ainda sobre o GV-Intel, na época, discordei de vários feedbacks, mas, hoje, com a maturidade, reconheço que muitos estavam corretos e eu estava ofuscado pelo otimismo comum aos empreendedores de primeira viagem. Quando consegui assimilar os insights – muitos deles críticas pesadas -, reavaliei o que estava fazendo e até mesmo se eu estaria com os sócios corretos. Eu e meu então sócio passamos a noite sem dormir, melhorando nossa apresentação e, principalmente, nosso discurso. No último dia de evento, fizemos um novo pitch para uma banca de jurados diferente. No final, ficamos em quarto lugar na competição.
Hoje, mais de 10 anos após minha primeira competição, fomos nos desenvolvendo, aprendendo com os erros e temos orgulho de ser uma das startups da saúde que mais recebeu prêmios nos últimos anos no país. É comum ouvir comentários ligando as participações em competições com a vaidade, o que pode até ter um fundo de verdade, afinal, empreender no Brasil é tão difícil que, um afago, de vez em quando, faz muito bem, não é mesmo? De todo modo, os afagos ao ego nem de longe são os verdadeiros benefícios.
Descobrimos que as premiações eram o caminho mais curto para acessarmos grandes contas, tais como multinacionais ou hospitais de elite, bem como nos conectarmos com outras startups e ecossistemas seletos capazes de nos alavancar.
Atuamos no mercado B2B, onde é muito difícil conseguir a atenção sendo uma startup e, mais difícil ainda, ter a credibilidade necessária para convencer uma grande empresa a praticar a famosa inovação aberta, modelo em que elas se abrem para trazer de fora as soluções em detrimento das feitas pelos seus próprios departamentos de P&D ou por outras grandes empresas.
Certa vez, um diretor de uma grande clínica me disse: “adorei a startup, mas não posso contratar porque se algo der errado estarei lascado. Agora, se eu contratar uma grande empresa e algo der errado, não será culpa minha”. Confesso que até entendo a situação, mas não significa que me conformei, afinal, quem nunca ouviu falar de um caso de insucesso de um projeto feito por uma grande empresa que atire a primeira pedra!
Estes problemas de acesso e de credibilidade diminuíram muito com os concursos de empreendedorismo. Neles, podemos nos comparar a outras empresas, muitas já famosas, e, então, confirmar que o produto que tínhamos era, de fato, diferenciado. Inclusive, vencemos competições no Japão, algo que há pouco tempo era inimaginável.
Ao longo do tempo fomos nos especializando nessas competições. Hoje, em quase todas que entramos, estamos dentre os primeiros colocados e, mesmo naquelas que não vencemos, é comum conquistarmos contratos indiretos. A exposição dos concursos é usualmente grande e promove acessos ao nosso site e gera leads qualificados por meio de boca a boca dentro das redes de contatos que geramos nos eventos.
Em concursos da Câmara de Comércio da Alemanha, a AHK, fechamos negócios com a Bayer e com o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, e a visibilidade gerada nos ajudou em contratos com outras indústrias. Em decorrência do renomado Ranking 100 Open Startups, fechamos com hospitais e operadoras. Já por meio do programa IdeiaGov, do Governo de São Paulo, ganhamos a oportunidade de fazer um projeto-piloto para o poder público dentro do Hospital das Clínicas de São Paulo (HCFMUSP), o maior da América Latina, o qual se desdobrou em outros dois projetos e em um grande contrato com uma multinacional. Esses são só alguns exemplos do quanto as competições podem ser úteis para os empreendedores.
Há um medo comum entre os empreendedores, que é o de “roubarem a sua ideia”. E eles estão certos. É possível, sim, “roubar” uma ideia, mas você precisa saber que ela não vale nada sem a execução! Logo, a questão é: esconder ou expor sua ideia para conseguir o apoio necessário para uma execução exemplar? Não existe resposta 100% certa, mas, no meu caso, falar foi o melhor caminho, especialmente nos concursos, pois, nesta jornada, encontrei muita gente que me ajudou a chegar onde estou. Acredito, sim, que algumas ideias minhas não executadas foram copiadas, mas gosto de pensar que, na verdade, inspirei outras pessoas a serem empreendedoras e, no empreendedorismo, quanto mais pessoas melhor para fortalecer o ecossistema.
Concursos valem a pena! Por isso, escolha aqueles que dão feedback de verdade, prepare-se e vá em frente. Eles vão aprender com você, mas você é quem vai aprender mais ainda. Sucesso!
André Ramos é CEO da Mindify, healthtech focada na automação de protocolos médicos via Inteligência Artificial.
0 comentário