* Por Luciana Antonini Ribeiro

De acordo com o Google Trends, mecanismo que mostra a popularidade dos termos buscados no Google, na última década é crescente o número de pesquisas pelo termo “propósito social”. Um estudo sobre o tema, publicado pela consultoria Accenture e chamado “To affinity and beyond”, ajuda a explicar esse interesse.

Para 62% dos consumidores que responderam à pesquisa, as empresas devem se posicionar sobre questões como sustentabilidade, transparência e práticas trabalhistas justas. Além disso, aproximadamente 60% dos mais jovens (que nasceram a partir do início da década de 80) acreditam que também é importante que as empresas assumam opiniões sobre direitos humanos, por exemplo.

A pesquisa conclui que, por causa dessas demandas dos consumidores, as empresas têm tomado decisões visando a promoção de benefícios coletivos – não só de ganhos individuais. E isso faz com que os indicadores para a mensuração de resultados das empresas também passem por uma transformação: de uma visão egocêntrica para outra, ecossistêmica. De um para todos.

Essas mudanças parecem ser um clamor da inteligência coletiva pelo resgate às bases do capitalismo, aos princípios morais que devem guiar as decisões de negócios. Explico citando o “pai do capitalismo”, Adam Smith. No seu livro “Teoria dos sentimentos morais”, ele escreveu que nós tomamos decisões com base nos nossos próprios interesses – mas, como somos seres sociais dotados de empatia, podemos converter desejos egoístas e passíveis de prejudicar outras pessoas em ações de benevolência e justiça social. Por isso, é o mercado, e a sua relação de ganha-ganha, a ferramenta mais eficiente para promover a justiça social.

Mas, como atender aos interesses pessoais e, ao mesmo tempo, promover justiça e benefícios sociais? Como criar novas morais e leis para os negócios? Anualmente, Larry Fink, presidente da BlackRock, maior gestora de recursos do mundo, tenta responder a essas questões numa carta aberta aos administradores das empresas nas quais a gestora investiu.

No texto, Fink, que é o maior responsável pelo dinheiro dos clientes e tem como missão entregar resultados financeiros, costuma recomendar práticas que impulsionam o crescimento sustentável, a lucratividade a longo prazo e a reputação dos negócios. E, na edição de 2019, ele defende que o propósito social e o lucro têm uma conexão inextricável.

Para o gestor de mais de 6 trilhões de dólares em ativos – três vezes o PIB do Brasil –, os lucros são fundamentais para as empresas atenderem não só os objetivos dos acionistas, mas os dos funcionários, clientes, fornecedores e comunidades. E as empresas não devem ter propósitos apenas para usá-los como slogans – mas porque eles são a razão fundamental para a existência dos seus negócios. O propósito social é a força que une e motiva as pessoas a buscar os lucros.

Desde a primeira carta publicada por Fink, cada vez mais empresas passaram a descrever claramente os seus propósitos sociais nos seus relatórios anuais. E foram lançadas certificações para padronizar a mensuração dos impactos positivos gerados pelas empresas – tanto para as pessoas quanto para o planeta.

Além disso, há cada vez mais exemplos de empresas que usam a inovação para oferecer soluções de consumo responsável. Por exemplo, a Lego planeja substituir por outras matérias-primas o plástico de todos os seus brinquedos e embalagens até 2030. No ano passado, a empresa lançou o seu primeiro produto feito de cana de açúcar.

Já a Nestlé começou neste ano a substituir os canudinhos de plástico das caixinhas de Nescau por canudinhos de papel. Dessa forma, ambas as empresas ajudam a reduzir o volume de plástico nos oceanos, por exemplo.

Na minha opinião, os desafios globais são complexos e interconectados – e pedem por uma visão sistêmica e por ações coletivas. Tomar consciência de que todas as nossas ações terão consequências no futuro é parte do processo de mudança. Nós temos o poder de construir uma nova realidade. Se compreendermos que o problema de um é o problema de todos, teremos uma nova moral norteadora para os negócios e os investimentos.

* Luciana Antonini Ribeiro é diretora e sócia-fundadora da gestora de private equity EB Capital, membro do comitê de investimento da gestora de venture capital e.bricks Ventures e do conselho consultivo da ONG The Nature Conservancy.

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