
*Por Caio Bretones
O cenário econômico brasileiro tem testemunhado uma transformação discreta, mas de grande impacto: a entrada de empresas de logística no universo dos serviços financeiros, com a chancela do Banco Central. O que à primeira vista pode parecer uma mera expansão de portfólio, é, na verdade, um movimento estratégico que redefine as fronteiras entre setores e promete democratizar o acesso a soluções financeiras, impulsionado, claro, pela tecnologia.
Tradicionalmente, pensamos em empresas de logística no âmbito operacional, como meros transportadores de bens. Contudo, essa visão ignora o vasto conhecimento e a capilaridade que essas empresas acumularam ao longo dos anos, sendo capazes de conhecer a fundo a realidade de seus clientes – desde o pequeno varejista na cidade do interior até a grande indústria da capital –, entender seus fluxos de caixa, desafios de estoque e necessidades de capital de giro. Essa proximidade e o volume de dados transacionais que geram são um tesouro inexplorado, agora reconhecido pelo regulador.
Com um aumento de concessões, principalmente no ano passado, quando diversas empresas de logística receberam autorização do Banco Central, a iniciativa é um reconhecimento da maturidade e do potencial disruptivo dessas companhias. Elas não estão apenas “virando bancos”; estão criando um novo paradigma: a logística financeira. Isso significa que o crédito, o pagamento e o seguro não são mais produtos isolados, mas serviços integrados ao fluxo de mercadorias. Imagine a agilidade de um pequeno produtor rural que, ao invés de enfrentar a burocracia bancária, consegue antecipar o recebível de sua safra diretamente com a cooperativa de logística que a distribui, com base no seu histórico de entregas e na qualidade do produto.
A tecnologia como essência
Tamanho avanço só tem sido possível com o suporte da tecnologia, que, ao permitir tal fusão, passa a ser essencial. Para tanto, algumas ferramentas são necessárias, como o Big Data e a Análise Preditiva, uma vez que as empresas de logística acumulam um volume gigantesco de dados: rotas, prazos de entrega, volumes transportados, histórico de pagamentos de frete, sinistros, dentre outros. Esses dados, quando processados por algoritmos de Inteligência Artificial (IA) e Machine Learning (ML), transformam-se em insights valiosos. A avaliação de risco para concessão de crédito, por exemplo, torna-se muito mais precisa e ágil, baseada em dados reais de comportamento e performance, e não apenas em balanços contábeis. Já a IA pode identificar padrões de inadimplência, otimizar ofertas de seguros e até prever necessidades de capital de giro antes mesmo que o cliente as perceba.
Há também a conectividade e as plataformas digitais, em que se dá a criação de APIs (Interfaces de Programação de Aplicações) robustas, permitindo que os serviços financeiros sejam integrados aos sistemas de gestão dos clientes. Isso significa que o acesso ao crédito ou a um seguro pode ser tão simples quanto um clique dentro do próprio sistema de gestão de estoque ou de vendas do cliente.
Portanto, a tecnologia permite que as empresas de logística não apenas ofereçam serviços financeiros, mas o façam de forma mais eficiente, personalizada e inclusiva do que os modelos tradicionais. Esse novo nicho está apto a atender um segmento de mercado muitas vezes negligenciado pelos grandes bancos, oferecendo soluções sob medida para a realidade de pequenos e médios negócios, que são a espinha dorsal da economia brasileira.
A tendência é um futuro em que a linha entre o físico e o digital, entre o serviço logístico e o financeiro, se torna cada vez mais tênue. É uma revolução que promete redefinir o acesso ao capital e impulsionar a competitividade de milhares de empresas brasileiras. O Banco Central, ao abrir essa porta, demonstra visão e pragmatismo, reconhecendo que a inovação pode vir de onde menos se espera, e que a tecnologia é a chave para destravar novos horizontes.
*Head da área de Digital na Dimensa, é empreendedor serial, formado em administração de empresas pela Universidade Mackenzie e fundador da Mobile2you Tecnologia, mobile-house especializada em desenvolvimento de produtos corporativos digitais sob-medida (tailor-made), que foi adquirida pela Dimensa, em fevereiro de 2022.
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