


A Endeavor divulgou o melhor Mapa de Acesso a Capital que já tive acesso. Agora que vocês já tem o mapa da mina, vou falar sobre o terreno – alias, o Gustavo Caetano tem um post interessante sobre o título desse meu artigo.
Fico muito contente com a qualidade dos materiais sobre empreendedorismo e os empreendedores seriais de segunda e terceira empreitada que estão surgindo. É muito prazeroso ver o ecossistema amadurecer.
Quando comecei na Ideiasnet há 15 anos atrás, existia pouco capital disponível para o empreendedor. A Ideiasnet foi o primeiro Venture Capital do Brasil a ser negociado em Bolsa. Isso ainda no ano 2000, quando, inspirado pelo SoftBank, fizeram o seu IPO. A minha primeira missão como estagiário na empresa foi conseguir um encontro com o Masayoshi Son (fundador do SoftBank) em qualquer lugar do mundo. Até hoje, ainda não consegui essa missão, mas continuamos na luta – o mais perto que cheguei foi um jantar oferecido pelo SoftBank no ano passado onde conheci o Marcelo Claure, que é uma pessoa com uma energia incrível.
Apesar de todos os altos e baixos do SoftBank, tenho muita admiração pelo visionário que é o Masa. Muitos o criticam, mas eu acho genial a apresentação dele de 25 de junho de 2010 – aniversário de 10 anos da apresentação! -, na qual identificou a solidão como um dos principais problemas da sociedade. Lembro que começava com um slide com as mensagens “A revolução da Informação – Felicidade para todos”. Ele trazia uma visão desenhada para os próximos 300 anos e considerava os primeiros 30 anos como os primeiros passos dessa jornada. Recomendo que assistam a apresentação. Mesmo 10 anos depois, segue ainda muito inspiradora para mim.
Fora da apresentação do Softbank, também gosto muito dessa frase do Gandhi:
Felicidade é quando o que você pensa, fala e faz está em harmonia.
Eu ficava encantado de ir nos eventos da ABVCAP (Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital) em São Paulo. A própria ABVCAP tem apenas duas décadas de história. Naquela época, 98% do trabalho era voltado ao universo de Private Equity e apenas 2% ao Venture Capital. Hoje o Venture Capital já ganhou muito mais espaço.
Falando em associação, lembro também que elas podem trazer muito valor. O meu sócio Rafael Pereira realiza um trabalho incrível presidindo a Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD). Os membros associados da ABCD são as fintechs: BCredi, Biz, Creditas, Enova, ErgonCredit, Geru, Guia Bolso, Lendico, Mercado Pago, MoneyMan, Nexoos, NoVerde, Pontee, Pravaler, QuiTech, Rebel, RecargaPay, RedAsset, Stone, Trigg e ZipDin.
O Rafael também contribui para o mapa da mina da Endeavor!
Voltando para o mapa
Na Rebel, levantamos:
- 4 rodadas de capital de equity
- Anjo
- Seed
- Series A
- Series B
- Uma linha de crédito
- 2 securitizações via debêntures
Jornada incrível de muito trabalho e coragem. Eu sempre tive vontade de passar por um ciclo completo de uma empresa, desde a criação até o pós-IPO. Atrás dessa vontade existe o sentimento verdadeiro de construir uma geração de líderes e ajudar milhões de brasileiros com novos modelos de negócios. Gosto muito de me reinventar a cada estágio da empresa e me adaptar às necessidades daquele momento. O estágio que estamos é mais ou menos no meio da jornada, ainda partindo para a profissionalização e consolidação.
Gostei muito do texto do Marcio Kumruian, que passou por todos os estágios em 20 anos. Ele comenta:
“Desde o primeiro aporte que recebemos – em 2009 com a Tiger Global – eu já sabia que aquele era o início de um processo de ‘desapego’, que o nosso filho estava crescendo e logo iria desbravar o mundo de forma independente ao lado de novas pessoas e novas conexões.”
É verdade que, quando levanta capital com o investidor, você já está vendendo a empresa, só que a prazo – pode ser um prazo bem longo. Não há nada de errado com isso. Existem vários empreendedores que levantaram muito capital e continuaram super envolvidos no negócio, assim como ainda seguiram com o controle da empresa. Depende muito da cultura que você constrói. E, particularmente, gostamos muito da cultura de dono.
Meu avô fundou o grupo Energisa 115 anos atrás. Uma história muito legal de empreendedorismo que já está na terceira geração da família. Meu tio conta aqui um pouco dessa história, que é também um pouco da história da energia elétrica no Brasil.
Eu tenho muita vontade de ser tão desbravador e inovador como o meu avô. Sempre me lembro das história dele distribuindo ações da empresa para os produtores rurais permitirem passarem os cabos de energia elétrica em seus terrenos. Stock Options raiz. A Energisa foi a primeira empresa a dar participação nos lucros para os funcionários no Brasil, em 1907.
Meu tio também comenta o momento difícil de ter dinheiro curto, que é a realidade da maioria das startups. Também fala de ousadia, conhecimento técnico, gente jovem, vontade de trabalhar, equipe, enfim, todos os fatores relevantes para a empresa dar um salto. Valores de aplicação rápida e simples, mas com muito estudo e cálculo por trás.
“Tenham em mente que sempre alguém sabe mais do que você. Então escute. Fale também, é claro. Mas você pode sempre aprender alguma coisa, mesmo que por menor ou maior que seja. Vai lhe fazer bem. Os canais de comunicação precisam estar limpos, desimpedidos e desentupidos. Você só consegue isso sendo simples. Se tiver muita burocracia acaba emperrando o caminho.” _ Ivan Botelho
Outra referência em termos de remuneração que tenho é ainda da época da Ideiasnet, quando o George Ellis falava:
“Salário é para você pagar as contas; bônus é para você fazer uma viagem legal; e opções são para você ficar bem de vida.”
O interessante da Ideiasnet era que, como as ações eram negociadas na Bolsa, o funcionário ou empreendedor conseguia ter liquidez. Voltando a Energisa e a fala do meu tio, também destaco o seguinte ponto de um século atrás: “vamos fazer a base da educação e com educação vamos trazer a indústria. Para a indústria vamos precisar de energia elétrica.“
Continuamos precisando muito de educação no nosso país para gerar uma nova transformação. Não mais industrial, mas sim de dados, conhecimento e tecnologia.
Lembro também do meu tio falando que não adianta ter toda a tecnologia no mundo e parar de funcionar ao tirar da tomada. Por exemplo: mineração de ouro consome 20 vezes menos que energia que Bitcoin.
Voltando 115 anos atrás, para o comecinho de uma ideia.
- Investimento Anjo
Esse é famoso Family, Friends and Fools – família, amigos e bobos. Está tudo muito detalhado no material da Endeavor.
No caso da Rebel, conseguimos anjos que já eram empreendedores seriais nos Estados Unidos. Muitos deles fundaram e trabalharam na fintech que trabalhei com o meu sócio em Chicago.
Ajuda muito ter logo no início empreendedores de sucesso lhe apoiando. Demonstra que você tem um bom networking e pessoas de sucesso que acreditam em você. Isso não é algo que se cria do zero. No livro que o Paulo Veras lançou essa semana sobra a história da 99 ele comenta:
“Eu brincava que o meu papel era ser o adulto responsável, garantir que as crianças não aprontassem demais na casa.”
Imagina a vantagem de ter como sócio alguém que já liderou a Endeavor no Brasil?! Sempre busquem sócios e pessoas que complementem as suas habilidades e fraquezas. De preferência, pessoas do bem e com valores alinhados.
A Endeavor cita geralmente de 8% a 16% de diluição para anjos. Recomento muito cuidado com anjos que entram querendo controle. Esses estão mais para diabo do que para anjo. Minhas referências para pitch deck que já é importante logo de início:
Ter a parte jurídica da empresa já bem estruturada logo de início também vai evitar muita dor de cabeça. Dica de dois outros livros que sempre carrego na palma da minha mão – Venture Deals e Reality Check: The Irreverent Guide to Outsmarting, Outmanaging, and Outmarketing Your Competition. O Venture Deals está nas sugestões da Endeavor.
- Investimento Seed
O Roni Bueno da Organica fez um post sobre Bootstrap vs levantar capital. Levantar capital não é para todo mundo. Escuto às vezes pessoas reclamando que Venture Capital não investe nos projetos, mas muitos projetos são o que chamamos de “Life Style Business”. São projetos bacanas que podem ser rentáveis e trazer muito sucesso para os fundadores, colaboradores e clientes, mas que não tem muito espaço para escalar exponencialmente. A regra do jogo é um TAM (Total Addressable Market) grande.
Nós, da Rebel, precisamos de muito capital para o tamanho do sonho que temos. A nossa Rodada de Seed foi super longa. A Monashees comenta que foi uma das que mais demorou para fechar. Aqui entrou uma questão: tínhamos a nossa holding numa jurisdição que não era padrão para os VCs no Brasil. Até nisso, inovamos. Mas pagamos o preço do tempo.
Mais uma vez, aqui a história e uma rede de contatos faz diferença. Para mim, um dos maiores segredos do Seed é que os fundos gostam de co-investir. Ter mais alguém que compre e que comprove a tese. Eu fiz MBA com um grande executivo, Leo Boguszewski, que apesar de super novo, presidia algumas empresas do grupo J. Malucelli, que co-investiu com o Monashees na nossa empresa. Fez muita diferença ter esses investidores juntos.
Conseguir ter um Venture Capital de placa como a Monashees e alguns outros que ainda dá para se contar nos dedos no Brasil faz muita diferença. É um grande selo de qualidade e vai lhe ajudar nas próximas rodadas. O nível de governança e suporte que eles trazem, por ser serem intrusivos, é muito grande.
Recomendo o podcast do Zero ao Topo com a história da Madeira Madeira. O Daniel Scandian conta muito bem a história deles com a Monashees (Marcelo, Eric e Fabio). Ele mostra muito bem o terreno. Vale ouvir os três primeiros minutos, que já resume tudo.
Gosto muito dessa frase da Endeavor:
“Semelhante a um processo de vendas complexas. Você está vendendo seu negócio para um novo sócio, o que exige mais disciplina que a própria venda B2B Enterprise.”
Segue mais uma dica aqui referente ao ponto “Envio de updates aos fundos de interesse”.
A Endeavor lista mais de 100 fundos de Venture Capital que já investiram no Brasil. Impressionante a marca! Tenho um carinho especial na lista pela Ipanema Ventures, que fundei em 2010; pela Valor Capital que participei bem no início da criação em 2013; pela Invus, que o David, que trabalhava na época na Valor, agora gerencia o fundo; e Monahsees, é claro, que nos suporta desde o início. Faltou na lista a FinTech Collective de NY, que é nossa investidora e que também investiu na Contabilizei. Impressionante que, de uma lista de cerca de 130 fundos, eu tenha essa relação e carinho mais próximo com 3% da base. Se incluir na conta a admiração pelo trabalho, acho que a lista já aumenta para uns 30%. Muitos fundos estão fazendo um excelente trabalho para fomenter e investor no empreendedorismo no Brasil.
- Series A e B
Para chegar aqui gostaria de comentar que, além de participar do Programa Scale-up Endeavor Fintech 2020, o programa do Google Launchpad também ajudou bastante para crescermos como empresa e para nos mostrarmos para o mercado.
O nível de profissionalização e a conversa com os fundos na Serie A e B sobe muito. Passamos por diversas due dilligences pesadas e nos ajudou muito sermos super organizados e tecnológicos. Somos uma startup que já nasceu com executivos experientes de mercado, mas com o espírito de quem está saindo da faculdade. O brilho do olho do fundador continua contando muito para essas rodadas, mas aqui os financials, processos e um unit economics saudável já precisa ser bem demostrado. Não tivemos nenhuma rodada fácil. Todas foram muitas suadas e tiveram vários momentos que poderiam ter ido por água abaixo. Realmente toma tempo levantar capital e não é todo empreendedor que está preparado para esse processo.
Depois de quatro rodadas de capital e duas securitizações eu sinto que ganhei um diploma de advogado – já sei todos os nossos documentos “closing binders” na vírgula.
O mais importante aqui foi que lidamos com pessoas super do bem e que queriam construir algo legal juntos. Fomos a primeira fintech a operar com a securitizadora Vert e a XP foi muito parceira para estruturar duas nas nossas debêntures que não tinham nada de plain vanilla.
Ah, tudo isso só começa mesmo quando você recebe um Term Sheet. E o mais difícil é encontrar o lead investors. Normalmente, tento um bom negócio, followers não vão faltar.
Enfim, o material da Endeavor é extremamente rico e super bem organizado. Não se assuste com a quantidade de informação. Utilize de acordo com a sua necessidade e estágio que você está. Ele é apenas um mapa, mas o que importa mesmo é o seu terreno!
Minha missão desde 2017 é deixar um legado para os brasileiros com mais acesso ao crédito e juros menores, nessa jornada pretendo formar novos líderes corajosos. Espero contribuir com os meus artigos para essa formação de líderes. Se você precisar lembrar cinco dicas para um pitch elevator, lembre-se:
- Pense grande! TAM enormes. Sonhar grande e sonhar pequeno dá o mesmo trabalho.
- Mostre paixão pelo seu trabalho e empresa. Se você não é apaixonado pela sua empresa, por que o investidor vai ser?
- Ética, transparência e comunicação com investidores é essencial.
- Pressão. No sentido que você que dita o ritmo da rodada.
- Não precisa contar logo de cara que o $ já acaba na semana seguinte vem rs.
Como o Scott Galloway e o Luciano Huck comentaram na entrevista deles que postei no meu artigo anterior, “nós temos primeiro que reconhecer nossos privilégios. Nós somos brancos, tivemos todas as oportunidades na vida, ganhamos dinheiro. E eu acho que, se esse 1%, no caso do Brasil, que sempre foi acusado de omissão quando o debate era sobre como reduzir desigualdades, não se empenhar para ser parte da solução, nós vamos colapsar em breve“. E finalizo dizendo que eu reconheço muito os meus privilégios e espero ajudar a construir um Brasil melhor para os empreendedores.
Glossário
IPO – é uma sigla para Oferta Pública Inicial, que é quando uma empresa vende ações para o público pela primeira vez. Isso também é conhecido como a abertura de capital.
Stock Options – Opções de Compra de Ações, que é uma forma de remuneração variável paga a funcionários do alto escalão que atingem determinados resultados dentro de uma empresa.
Pitch deck – uma apresentação que mostra um panorama geral de um negócio para investidores e fundos de investimento.
Bootstrap – quando uma empresa consegue crescer sem investimento externo, ou seja, usando os seus próprios recursos e preferencialmente pouco dinheiro.
Fomenter – fomentador.
Investor – investidor.
Due dilligences – processo de investigação de uma oportunidade de negócio que o investidor deverá aceitar para poder avaliar os riscos da transação.
Financials – finanças.
Unit economics – conhecimento da estrutura financeira e de indicadores do negócio.
Closing binders – depois de fechar um negócio, um advogado irá compilar todos os documentos finais.
Plain vanilla – expressão que se refere a um instrumento financeiro na sua versão mais elementar ou genérica.
Term Sheet – documento de acordo pré-investimento, que empreendedor e investidor assinam, como uma “carta de intenções”.
Lead investors – investidor líder.
Followers – seguidores.
Pitch elevator – pitch de elevador é uma forma curta de apresentar o projeto de um negócio.
Total Addressable Market – TAM significa mercado total de um determinado produto ou serviço.
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