* Por Tatiana Pimenta

No final de 2015, há pouco mais de 3 anos eu abandonava de vez a carreira executiva para embarcar em um dos maiores desafios da minha vida: empreender!

No dia 6/12/15 sentei pela primeira vez com o Everton, meu sócio, e o convidei a criar algo novo para a área de saúde. Tinha percebido o quanto sofremos com a falta de acesso a bons profissionais de saúde nas cidades menores do nosso país. Durante um café, numa padaria em moema, rabiscamos em um papel de pão uma análise SWOT, listamos uma série de players internacionais como benchmark e desenhamos o conceito do negócio que tínhamos em mente. Queríamos que o acesso a saúde de qualidade estivesse nas mãos de cada pessoa do nosso país.

Depois dessa data, mergulhei de cabeça em eventos, meetups, workshops de tecnologia em busca de conhecimento e de uma pessoa que pudesse nos ajudar a desenvolver o produto. Em maio de 2016 nascia formalmente a Vittude.

Nasce uma empreendedora

Empreender
não é algo fácil. Pensando em Brasil, tomar a decisão de fundar uma empresa
talvez seja uma das escolhas mais arriscadas que alguém pode fazer. Vivemos em
um país repleto de oportunidades, mas também de muita burocracia.

Ter decidido abrir uma empresa em um setor totalmente desconhecido na época, mais parecia loucura do que uma decisão sensata. Sou engenheira civil de formação e, ao longo de 13 anos, construí uma carreira executiva bastante interessante.

Atuei em grandes corporações de capital nacional e multinacional, tendo circulado por áreas como logística, operações e vendas. Esta última foi onde descobri uma vocação ou paixão. Adoro vender, amo estar rodeada de pessoas, conhecer pessoas novas e descobrir novas oportunidades.

Trabalhei
em grandes grupos cimenteiros e florestais. Depois de uma curta passagem em uma
construtora, posso dizer que comecei minha carreira como trainee do Grupo
Votorantim. Lá, tive a oportunidade de aprender de tudo. Fui promovida e
transferida uma porção de vezes. Comecei em São Paulo, depois morei no Rio de
Janeiro, Santos e Salvador. Foram 3 anos na Bahia, estado que me deixou muita
saudade e onde cheguei a ter equipes operacionais com mais de 100 pessoas.
Retornei a Sampa em 2010, para nunca mais sair daqui.

O contexto pessoal

Até 2015, nunca tinha me envolvido com empresas de tecnologia. Tampouco conhecia o mercado de saúde. Mas havia dentro de mim uma inquietação que era grande demais para ser ignorada. Como usuária de serviços de saúde sentia que faltava algo.  Nasci e cresci em uma cidade chamada Corumbá, interior do Mato Grosso do Sul. Meus pais até hoje moram lá. Ao ver meus pais envelhecendo, também percebi crescer dentro de mim um medo de que um deles adoecesse.

Na minha cidade natal não há um hospital de referência, praticamente não existem médicos especialistas. Existem, sim, clínicos gerais, que acabam atendendo a população, mas que na grande maioria das vezes, pararam no tempo, sem especialização, sem um aprimoramento ou algo do tipo. Ao longo da última década observei minha mãe se deslocar 430 km para ir ao oftalmologista, devido a ausência de um profissional experiente na minha cidade.

Em
2015 meu pai recebeu um diagnóstico de câncer. Meu medo, que já existia,
cresceu mais ainda. E agora? O que eu faço? Costumo dizer que, por uma ação do
destino, também fui demitida do meu último emprego na mesma época (auge da
crise da construção civil). Graças à minha demissão, pude acompanhar todo o
tratamento do meu pai de perto. Decidimos que a melhor opção era vir para São
Paulo, onde eu já morava e tinha indicação de excelentes profissionais.

Foi durante todo esse processo, que percebi que a tecnologia poderia ser muito último para facilitar o acesso. Em especial, foi nesse momento que eu vi despertar em mim uma curiosidade pela telemedicina. O que senti falta, na ocasião, foi a possibilidade de ao menos receber orientações médicas por telefone, email ou video call. Diante do resultados dos exames, gostaria de saber o que fazer, mas nenhum médico topava conversar por telefone antes de ver o paciente pessoalmente.

E, já na primeira consulta presencial, uma frase me incomodou. Os exames poderiam estar errados, as avaliações de patologia em cidades menores não eram de confiança. Pensei em silêncio: isso não poderia ter sido dito por telefone? A patologia foi refeita e o câncer confirmado, mas e se estivesse errado? E se realmente não houvesse a doença? Quanto dinheiro gasto com deslocamento e, principalmente, quanta angústia vivida nos dias e semanas anteriores.

Quando
meu pai retornou para casa, eu tirei uns dias de férias. Viajei, corri uma
maratona e usei a oportunidade para pensar na vida. Nessa altura tinha 2
certezas: não queria mais ser empregada e tinha chegado a hora de alçar voo
solo. Minha demissão tinha me incomodado e jurei para mim mesma que não viveria
aquela situação novamente. Ao mesmo tempo, o bichinho do empreendedorismo
sempre havia estado presente. Meus pais são empreendedores, possuem um
restaurante em minha cidade há 30 anos.

Conectando pontos

Todo
o contexto vivido com meu pai, aliado à experiência de sempre vê-los se
deslocar quando precisavam de alguma consulta médica mais específica, foi o
gatilho para escolher a saúde como setor para empreender. Eu sentia dentro de
mim que precisava fazer algo.

Nos
meses seguintes descobri que saúde era algo muito amplo. Então, examinando
caminhos, possibilidades e minha experiência pessoal, entendi que o caminho era
escolher um nicho e foi então surgiu a ideia de focar em saúde mental.

Steeve Jobs certa vez disse que não podemos conectar pontos olhando para frente. Nós só conseguimos conectar os pontos olhando para trás. Segundo Jobs, nós temos que confiar que os pontos de alguma forma vão se conectar no seu futuro. E foi assim que, olhando para o passado, vi os pontos se conectando.

Eu faço terapia desde 2012, tive uma grande dificuldade para encontrar meu primeiro psicólogo. Passei por experiências frustrantes tentando encontrar um psicólogo do plano de saúde. Percebi o quão difícil era escolher um profissional de psicologia, e mais ainda construir um vínculo com um.

Das
minhas experiências pessoais nasceu a ideia de construir uma plataforma para
conectar pessoas que querem fazer terapia a psicólogos.

Uma riqueza chamada conhecimento

Por não ser profissional da área e não ter experiência com tecnologia, precisei aprender tudo do zero. O primeiro caminho foi ler, e ler muito. Em 2016 e 2017 cheguei a ler, em média, 4 livros por mês. Desde o básico sobre startups, como Startup Enxuta e Business Model Generation, a biografias de empreendedores. Ler The hard things about the hard things foi muito bom. Sabia que a jornada que vinha pela frente não seria fácil, mas que havia um prêmio para os persistentes.

Participei de muitos eventos, conheci gente brilhante, recebi um montão de mentoria e troquei muita informação. Aprendi que uma característica me levaria além: ser “coachable”. Era preciso saber ouvir feedbacks, muitas vezes duros, e não achar que era pessoal e sim testar rapidamente o que os mentores apontavam.

Acredito que o fato de não ter experiência nem em tecnologia, nem em saúde, me fez mais humilde. Eu tinha a cabeça aberta a aprender e uma sede imensa de obter mais e mais informações. Hoje, há quem jure de pé juntos que sou psicóloga, tamanha a minha segurança para falar de assuntos técnicos da área. Também ganhei experiência prática em tecnologia, aprendizado que vem do erro e acerto, da experimentação, do aprender na pele, errando com o próprio dinheiro e corrigindo rapidamente.

Tem sido uma trajetória muito rica. O mais valioso? Com certeza o aprendizado. Esses 3 anos valeram muito mais que qualquer MBA em uma Ivy League. E, mesmo se algum dia tudo der errado, se “quebrarmos”, tenho uma certeza: terá valido à pena. Em 3 anos vi nascer uma nova Tatiana, mais madura, humilde e persistente.

Tenho muito orgulho da trajetória até aqui. Construímos do zero uma empresa que já atendeu milhares de pessoas. Avançamos bem mais do que pensei naquele 6/12/15. Ganhei prêmios, tive a oportunidade de visitar o Vale do Silício por duas vezes, uma a convite do Airbnb e outra pelo Google for Startups.

Fui a única empreendedora brasileira selecionada em 2018 para um programa de imersão super concorrido, chamado BlackBox, em São Francisco. Além das pessoas que estão em cidades de interior, também chegamos a mais de 40 países, levando acesso a saúde mental para brasileiros que vivem fora do nosso país.

Que venham os próximos 3 anos!


Tatiana Pimenta, CEO e fundadora da Vittude. Faz psicoterapia pessoal há mais de 5 anos. É uma grande estudiosa de diversos assuntos relacionados à saúde mental. Tem dedicado atenção especial ao tema da felicidade e à forma como reprogramamos nosso cérebro para ter mais emoções positivas. Possui mais de 15 anos de experiência profissional, tendo atuado em organizações nacionais e multinacionais de grande porte como Votorantim, Cimpor (Cimentos Portugal), Arauco e Hilti do Brasil.

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