* Por Anderson Arcenio

Muito se fala do impacto que a transformação digital pode trazer para as grandes empresas. Mas apesar de dentro desta pauta realmente termos diversas possibilidades de avanços, como a digitalização de processos, uso de tecnologia para otimização de processos operacionais e melhora na experiência dos clientes, a verdade é que estamos passando por transformações com um potencial de impacto ainda maior.

Vivemos em uma época de transformações sociais e culturais, e o impacto delas nos negócios é enorme. Estamos mudando a maneira com que lideramos nossas empresas, desenvolvemos e distribuímos nossas soluções e, principalmente, a forma com que continuamos inovando.

A
inovação aberta

Inovação aberta, ou em inglês open innovation, é um termo criado em 2003 por Henry Chesbrough para as indústrias e organizações que promovem ideias, pensamentos, pesquisas e processos abertos a fim de melhorar o desenvolvimento de seus produtos, prover melhores serviços para seus clientes, aumentar a eficiência e reforçar o valor agregado.

Com a
inovação aberta, acredita-se que a detenção do conhecimento e a identificação
de novas soluções podem estar em qualquer lugar, tanto interno quanto externo,
de uma cadeia de valor de uma empresa. Ou seja, através de funcionários de
distintas áreas, fornecedores, parceiros, universidades, outras empresas e etc…

Agora pensa
comigo, qual a entidade atual que mais representa inovação? Exatamente, as
startups. E é por isto que se considera tanto o fato de que a inovação nas
grandes empresas será aberta e passará pelas startups.

A
mentalidade e a expectativa correta

Existem
vários caminhos para as grandes empresas, ou corporates como são mais
conhecidas neste ecossistema, se relacionarem com as startups.

Mas antes de
sugerir um caminho para iniciar este processo, vamos fazer uma reflexão juntos.
Sabemos que qualquer mudança radical traz inúmeros desafios e resistências.
Sabemos também que esta transformação é algo novo e repleto de incertezas,
certo?

Analisando estes ingredientes, vemos muito do contexto existente no dia a dia de uma startup. Então, já que estamos falando de como nos relacionar com ela, por que não pensar como uma startup pensa para entender como começar esse processo de inovação em corporates?

Considerando
algumas características comportamentais dos fundadores de startups temos:

  • Pensamento enxuto e agilidade

As startups, em geral, possuem recursos limitados para atingir seus objetivos e crescimentos exponenciais. Com isso acabam desenvolvendo uma habilidade de sempre buscar a solução mais otimizada e simples para determinada situação.

Velocidade no curto prazo e paciência no longo prazo. Esta costuma ser a mentalidade das principais startups. Com uma estrutura enxuta, ela consegue ser mais ágil para seus avanços diários, sendo estes sempre em direção aos seus grandes propósitos de longo prazo.

  • Experimentação e tomada de risco

Quando tratamos de ambientes incertos, precisamos antes de tudo aceitar que o erro faz parte do processo. A lição mais importante de um método científico é: se você não pode fracassar, você não pode aprender.

Pequenos experimentos mensuráveis geram diversos aprendizados. Estes aprendizados muitas vezes nos obrigam a mudar de estratégia ou proposta de solução. Isto é totalmente aceitável, e inclusive deveria ser valorizado, afinal quanto mais rápido descobrimos, mais tempo, recurso financeiro e energia economizamos.

E outro detalhe importante: é necessário ter um bom alinhamento na definição de sucesso. Se a métrica for um resultado financeiro em curto prazo, provavelmente ela não será atingida. É preciso ter métricas mais coerentes para o cenário de inovação.

Agora sim, como começar o relacionamento entre corporates e startups?

Existem
diversas formas do relacionamento de grandes empresas com startups acontecer. A
implementação de cada uma delas vai depender do estágio de maturidade em
inovação aberta e do design organizacional que a empresa possui.

Poderíamos
falar sobre a possibilidade de criar sessões de matching, coworking, programa
de aceleração corporativa, corporate venture ou um programa de desenvolvimento
de startups internas, mas vejo todos estes itens exigindo uma maturidade e uma
capacidade de investimento mais altas.

Portanto vamos trabalhar com uma sugestão que considera a mentalidade citada anteriormente e um estágio totalmente inicial de engajamento e que pode ir evoluindo aos poucos:

Reparem que estamos iniciando com um único objetivo bem claro e duas grandes linhas de solução para ele. Reparem também que existe uma mudança de cor gradual nos itens, a representação é de que quanto mais investimento ou envolvimento da corporate for necessário, mais escura fica a cor do item.

         Vamos
agora detalhar um pouco cada item:

  • Problemas ou necessidade: o principal motivo de falha das startups constatado hoje é devido elas desenvolveram uma solução que o mercado não precisa. Se partirmos sempre de um problema ou necessidade existente, fica mais fácil desenvolvermos boas soluções. Portanto, em vez de pensarmos em programas complexos de investimento, vamos iniciar esse relacionamento de maneira bem direcionada e enxuta, escolhendo um problema significativo que a empresa está enfrentando no momento.
  • Busca por startups existentes: se o problema não for extremamente singular, é provável que já existam novas soluções sendo desenvolvidas para ele. Só no Brasil já temos mais de 10.000 startups, quem sabe não é possível encontrar uma para resolver esta demanda.
  • Prospecção: a grande empresa pode utilizar bases de dados para encontrar novas soluções, e as que passarem por critérios de seleção podem ser prospectadas.
  • Chamada pública: um outro caminho, complementar ou não, pode ser a realização de uma chamada pública, convocando startups que possam solucionar o problema em questão.
  • Contratação ou POC: uma vez que novas soluções foram encontradas, e uma delas foi selecionada com potencial de resolução daquele problema, é possível avançar em um processo de contratação ou ao menos de uma prova de conceito. Um detalhe importante é que as startups possivelmente não atenderão alguns critérios do setor de compras, portanto aqui já se inicia um processo de aprendizado, adaptação e desburocratização para que seja possível iniciar um relacionamento adequado com a nova empresa.
  • Resolução do problema: este é o principal objetivo desta iniciativa, encontrar uma solução inovadora para um problema existente. Entretanto, o processo como um todo, desde a seleção até a contratação, deve gerar novos aprendizados, principalmente nos quesitos de cultura e agilidade que as startups possuem.
  • Comercialização conjunta: até aqui falamos de etapas com baixos investimento e risco, além de um relacionamento moderado. Esse era realmente o objetivo, começar pequeno, experimentar. No caso de uma boa prestação de serviço, com a confiança sendo construída, podemos avançar esta relação para níveis maiores. Uma delas por exemplo, é atuar como um canal de distribuição daquela nova solução, agregando valor para a própria cadeia de clientes ou fornecedores da grande empresa.
  • Corporate venture: por fim podemos chegar no “casamento”. Neste momento, o relacionamento entre as empresas estará muito forte e a oportunidade de negócio estará mais comprovada com o impulsionamento desta relação. Com isso é possível dar um outro passo, onde a corporate pode deixar de ser apenas uma cliente e parceira comercial para se transformar em sócia daquela startup.

Já a outra linha de solução nos mostra:

  • Criação de uma nova startup: pode ser que nenhuma solução aderente ao problema definido seja encontrada. Neste caso, podemos partir para uma solução mais complexa: apoiar o desenvolvimento de uma nova startup.
  • Hackathon: como vimos, na inovação aberta acredita-se que novas ideias e soluções podem vir de qualquer lugar, portanto um bom caminho pode ser organizar uma maratona de programação ou hackathon como é mais conhecido. Em um período curto e intenso de tempo novas soluções são prototipadas. As que tiverem mais potencial podem ser incentivadas para a continuação e implementação completa.
  • Corporate venture builder: existem empresas especializadas em desenvolver novas soluções. Evoluindo da etapa de idealização até a operação efetiva da solução. Encontrar um bom fornecedor pode ser um caminho mais prático, porém que exigirá um maior investimento financeiro. Um detalhe importante é não encarar isso como um projeto customizado que vai servir apenas para aquela empresa e sim como algo que pode ser utilizado depois por outras empresas, criando assim um novo negócio e uma nova fonte de receita.
  • Desenvolvimento de uma startup interna: esse diz respeito a abertura do problema para toda a equipe e não apenas para o pessoal de pesquisa e desenvolvimento. Montar um squad com uma equipe enxuta e multidisciplinar com liberdade e responsabilidade para criar experimentos de soluções pode também ser um caminho muito interessante. Por outro lado, esse é um dos mais complexos devido à provável mudança de mentalidade e cultura que exigirá na empresa. Para quem se interessa por este assunto, existem ótimas referências disponíveis, como os livros Organizações Exponenciais, o Estilo Startup (do mesmo autor do famoso Startup Enxuta) e muitos outros.

E independente do caminho seguido nesta linha de criação de uma nova startup, o avanço será semelhante ao falado anteriormente, com a resolução do problema, possível comercialização em conjunto e investimento no novo negócio.

Como vimos, os caminhos e desafios são diversos, porém as oportunidades também serão!

Se você é uma grande empresa e acredita que seu negócio é imune a estas transformações, gostaria que refletisse um pouco mais. Avalie a quantidade de mudanças tecnológicas e em negócios que aconteceram nos últimos 10 anos. E mais do que a quantidade, avalie a velocidade que estão acontecendo.

 Os negócios podem ter funcionado muito bem até aqui, mas não temos garantia nenhuma de que vão continuar funcionando daqui em diante. E ninguém quer ser mais uma empresa tradicional que acabou perdendo espaço para uma nova empresa que inovou mais, não é? Os benefícios de se iniciar esse relacionamento com as startups, valem os sacrifícios da transição. Vamos inovar?!


Anderson Arcenio é cofundador e CEO da Digital Labs, venture builder responsável por criar startups como o Salus e Protarefa. Também é cofundador do Livebuzz e Sócio da Dinamize. Com 14 anos de experiência com projetos digitais, é pós-graduado em Gerenciamento de Projetos – práticas do PMI, pelo Senac e bacharel em Sistemas de Informação, graduado pela Universidade Estadual Paulista – UNESP.

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