* Por Erik Nybo

O mercado de startups está se tornando cada vez mais maduro no Brasil. Por conta disso, diversas práticas comuns no início do crescimento desse mercado no país já não são defendidas como eram antes. Ao mesmo tempo, surgem novas formas de desenvolvimento desse mercado uma vez que as pessoas tiveram alguns aprendizados conforme a experiência demonstrou. Um indicativo dessa maturação é inclusive a formulação de um marco legal para startups que provavelmente será apresentado para consulta pública a partir do mês de maio deste ano.

Dentro dessas mudanças que o mercado de startups brasileiro está vivenciando está a forma pela qual as startups se financiam. O mercado de financiamento de startups evoluiu muito nos últimos anos. Embora não haja um número grande fundos e investidores brasileiros focados em financiar startups (venture capital) e os valores investidos sejam inferiores àqueles apresentados em outros países, o país já apresenta um mercado próprio de investimento em startups. Esses financiamentos também se difundiram por meio da criação de grupos de investimento anjo em diversos ambientes e também pela regulamentação do equity crowdfunding.

Outro agente de financiamento importante nesse mercado são as empresas, as quais passaram a financiar startups por diversas razões. Uma dessas razões está ligada a criação de projetos de inovação baseados no financiamento e investimento de startups – corporate venture. Preocupadas com a sua inércia estrutural (a incapacidade de trazer respostas rápidas às constantes mudanças do mercado), as grandes empresas passaram a criar programas de inovação muitas vezes baseados no investimento, aceleração ou incubação de startup.

Apesar de se apresentar como uma boa iniciativa, o corporate venture costuma ter diversos problemas. A princípio, o corporate venture costuma demorar muito por conta da necessidade de compatibilização entre startup e empresa – isso envolve a flexibilização de medidas de compliance, diferenças no processo decisório e modelos de governança corporativa, por exemplo. Além disso, os processos de investimento realizados por empresas costumam demorar muito em virtude da necessidade da due diligence, valuation, dentre outras etapas necessárias para que o processo ocorra. Por fim, existem aqueles programas de corporate venture criados apenas para fins de marketing já que startup está na moda. Diante dessas dificuldades, o corporate venture costuma apresentar dificuldades e por isso não representa hoje o formato mais comum de estímulo ao mercado de startups.

Nos últimos anos, no entanto, surge com cada vez mais força outra forma de financiamento de startups tendo em vista a dificuldade de projetos de corporate venture darem certo. Essa maturação do mercado de startups no Brasil trouxe, no entanto, um novo formato de financiamento que se torna cada vez mais comum: venture client. Nesta modalidade, as grandes corporações funcionam como o primeiro cliente disposto a testar produtos e serviços de startups. Esse tipo de financiador é importante, pois possibilita às startups adquirir um capital de giro necessário para que possam iniciar seu projeto de penetração no mercado. Nesse aspecto, alguns corporate venturers chegam até mesmo a adiantar os pagamentos para que a startup consiga desenvolver seu protótipo ou para que tenha fluxo de caixa suficiente para fornecer o produto/serviço desejado pelas corporações.

É importante que neste modelo as grandes empresas entendam o ciclo de vida de uma startup e a forma como opera. Nesse sentido, as grandes corporações precisam ter prazos de pagamento condizentes com as necessidades dessas startups – em vez dos tradicionais 60 ou 90 dias de prazo para pagamento de serviços que se difundiram e se tornaram comuns entre as grandes empresas no mercado brasileiro. Para que essa modalidade de financiamento seja possível as empresas também precisam flexibilizar os requisitos nos departamentos de compras e adoção de políticas de compliance para contratação. Afinal, as estruturas enxutas das startups geralmente não permitem que elas estejam em conformidade com os requisitos de compliance e governança exigidos pelas grandes corporações a outras empresas nos processos de contratação. Esses ajustes necessários nos processos de compra possibilitam que as startups participem dos processos de cotação – no entanto, não basta apenas isso.

Diante do desconhecimento de que as empresas estão dispostas a flexibilizar as formas de contratação as startups dificilmente sabem que existe essa possibilidade. Por isso é importante também que as grandes corporações anunciem sua intenção de agirem como venture clients.

O venture client portanto proporciona o que a startup mais precisa: um bom cliente. Pensando nisso, a empresa que utiliza uma startup como fornecedora pode auxiliar no seu crescimento ao oferecer Feedback sobre o produto/serviço, auxiliar com a sua maior capacidade de fluxo de caixa antecipando pagamentos, por exemplo, de forma a financiar de alguma forma projetos de startups. Do outro lado, as grandes corporações tem a possibilidade de um aprendizado, tem estímulos de inovação e a introdução à nova economia.


Erik Fontenele Nybo, cofundador da EDEVO e head de inovação no Molina Advogados. Foi gerente jurídico global da Easy Taxi, tendo criado o departamento jurídico e foi responsável pelas questões legais em todos os países de atuação da empresa. Autor e coordenador do livro “Direito das Startups” (Juruá), autor no livro “Regulação e Novas Tecnologias” (Forum) e coordenador do curso “Direito em Startups” no INSPER. Pesquisador do GVCEPE – Fundação Getúlio Vargas. Advogado formado pela Fundação Getúlio. Email: erikfnybo@gmail.com

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