* Por Marcus Vinícius Anselmo
Essa semana, eu pretendia escrever um artigo sobre Terracotta Ventures, negócio que estamos criando para investir e impulsionar inovação em construtechs e proptechs, mas dois eventos no mercado aconteceram e achei importante falar no assunto.
Na última semana, a empresa americana Procore, anunciou a aquisição da Construction BI, ferramenta de análise suportado para Inteligência Artificial destinada a indústria de construção. A aquisição é a terceira da plataforma de gestão da construção, que nesse ano já adquiriu a HonestBuildings, software de compartilhamento de informações entre construtoras e contratados, e no ano passado a BIMAnywhere, plataforma de colaboração em BIM.
O movimento reforça a estratégia que a empresa vem seguindo desde o início de 2016 quando lançou um marketplace de aplicações e passou a se posicionar como plataforma de software para construção.
O movimento não é exceção no mercado americano. Em novembro de 2018, a gigante Autodesk, adquiriu a Plangrid por US$ 875 milhões, quase posicionando a startup como um unicórnio.
Aquisições também são parte da estratégia da Zilow, marketplace americano de real state, que desde 2012 fez 12 aquisições dentre as quais a Dotloop, plataforma de intermediação online, por US$ 108 milhões e a RentJuice, locação e serviços relacionados.
O site Construtech.com, por exemplo, cita mais de 60 aquisições realizadas no setor, a maioria de empresas de tecnologia. Esses fatos mostram que empresas do setor de construção já estão acompanhando o ecossistema de construtechs e proptechs e aquisições se tornaram uma estratégia estabelecida de expansão e transformação de negócios.
Embora não tão comum no mercado americano, empresas brasileiras da indústria da construção já têm feito aquisições. Na mesma semana do anúncio da Procore, o portal de compra e vendas brasileiro OLX, anunciou a aquisição da anapro, uma solução de marketing e vendas para o setor imobiliário. Com isso, a empresa reforça a sua posição no mercado imobiliário obtendo acesso a uma grande base de imóveis e corretores, um dos principais desafios para o crescimento de portais de imóveis.
No primeiro semestre deste ano, a Ambar, startup investida pela TPG e E-Bricks, anunciou a aquisição da Conaz, marketplace B2B de insumos para construção e da Controller, APP para controle de execução em canteiro de obra. Com essas compras, a Ambar avançou na criação de uma plataforma digital esd-to-end para a indústria da construção e integrou fornecedores e construtoras em um mesmo ambiente, além de atacar ineficiência e desperdício, um dos principais problemas na cadeia da construção.
A catarinense Softplan, segue o mesmo caminho. Embora ainda não tenha feito nenhuma aquisição, a empresa transformou o Sienge, seu software para gestão de construtoras e incorporadoras, em uma plataforma com outros aplicativos conectados, e investiu em startups como Infraspeak, CoteAqui e Emcasa. Aparentemente é questão de tempo para que a empresa faça sua primeira aquisição.
Vários outros casos existem no mercado brasileiro. A Loft, empresa que desenvolve o modelo de flipping (aquisição de imóveis para reforma e revenda), atua desde o início com uma estratégia de crescimento por aquisições. Outro caso de destaque no mercado é o VivaReal que, antes de sua fusão com o ZAP Imóveis, adquiriu a SuaHouse, GeoImóvel e Sub100.
Curiosamente, os players estabelecidos do setor, como construtoras, incorporadoras, imobiliárias e indústria, ainda não fizeram aquisições no setor. Porém, alguns movimentos de investimentos já mostram que esses players ensaiam movimentos.
A análise do mercado de aquisições em construtechs e proptechs no Brasil, mostra que o foco das aquisições tem sido, na maioria, de pequenas startups de software. Um dos principais objetivos de aquisição é o de potencializar sua oferta principal, como a Conaz que amplia a capacidade da Ambar em aumentar a eficiência operacional no processo de compras. Outro objetivo parece ser a sinergia entre dados, como no caso da OLX, que pode aumentar o volume de ofertas de imóveis e facilitar as transações com a aquisição da Anapro.
O aumento desses movimentos de aquisição pode ter relação direta com o aumento de startups na cadeia da construção. Um levantamento realizado pelo Construtech Ventures em novembro de 2017, mostra que existiam aproximadamente 250 construtechs e proptechs no Brasil. No entanto, no levantamento de agosto que fizemos pela Terracotta, identificamos mais de 500 startups no setor, apenas no Brasil.
O nível de maturidade também está mudando, desde janeiro de 2018 mais de R$1,7 bilhão foi investido em startups atuantes no setor. O interessante é que neste período, de um total de 44 rodadas, 31 foram realizadas em estágio seed. Ou seja, existe uma quantidade cada vez maior de empresas que saem de um cenário de experimentação para o foco em crescimento que nos próximos anos tendem a buscar investimentos maiores.
O impacto dessas empresas pode ser ainda maior em M&A, segundo relatório da CBInsights, onde mais de 95% dos exits de startups são em aquisições. O relatório também mostra que mais de 50% dessas saídas são após investimentos seed/series A (early exits).
Considerando o número cada vez maior de construtechs e proptechs nos últimos anos, com várias delas aproximando-se desse estágio, devemos observar um aumento de saídas em estágios preliminares.
Como mencionado, o momento para observar o mercado de construtechs e proptechs é excelente, considerando o crescimento do mercado e o início do surgimento dos cases de sucesso entre corporações e startups. Todavia como a startup pode estar preparada para acompanhar esta onda e captar investimentos ou estar se relacionando com maior facilidade com os grandes players do mercado? Mauricio Carrer, fundador da construtech InstaCasa, que acaba de realizar sua primeira captação seed, explica que estar próximo a grandes players do setor em que se pretende atuar pode ser um fator de validação do negócio frente ao mercado. “Participamos do processo de inovação de uma grande empresa do setor imobiliário e fomos selecionados para um projeto-piloto com ótimos resultados, o que sem dúvida contribuiu para a percepção de valor tanto de outras empresas do setor como para investidores”, explica Mauricio.
Muito dos investidores, principalmente os mais parrudos, e empresas que relevam bastante o nível de governança corporativa observam a experiência dos fundadores no mercado de atuação e se já falharam e, assim, já estão calejados suficientemente para o crescimento.
Nesta análise, um ponto interessante e que, por muitos empreendedores, ainda acaba sendo descartado é o aspecto jurídico da startup, que culturalmente ainda enxergam o advogado como um cara chato que só dará trabalho e custa caro.
O ponto é que o advogado acaba sendo uma figura de alto impacto para a startup no momento de negociar as melhores condições com o investidor ou com o parceiro estratégico, pensando em longo prazo e na construção de uma estrutura jurídica que de segurança a todos os envolvidos no projeto.
Segundo o diretor da InstaCasa, empresa de projetos de casas pré-prontas, o BNZ trouxe ganho perceptível para a startup, “Através do nosso processo de investimento foi perceptível o ganho que a assessoria jurídica da BNZ nos trouxe, tanto no que tange a estruturação societária, como no nível de governança que pretendemos imprimir no negócio. Recomendo que todo empreendedor, que pense em realizar captações, conte com uma assessoria jurídica desde o início, a fim de preparar a estrutura necessária e assim facilitar o recebimento do aporte quando for o momento”.
Como mencionado, no início do texto, startups em fase inicial estão sendo muito bem observadas por corporações em operações de aquisição, e por esta razão o empreendedor já precisa contar com um advogado de confiança e que entenda do mercado de venture capital para assumir esta responsabilidade.
No caso, os principais pontos de atenção nesta fase para um empreendedor levar em consideração e discutir com seu advogado são os aspectos societários, cap table, risco trabalhista, tributário, propriedade intelectual, contratos bem elaborados com clientes, fornecedores, parceiros e advisors, e, agora, com a questão das boas práticas para o cumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados. Isto tudo para demonstrar ao parceiro estratégico que a startup está preparada para receber um investimento e o fundador já é uma pessoa altamente preparada para assumir uma empresa que tem tudo para crescer rapidamente.
Do outro lado, a maioria dos players relevantes do setor Imobiliário e da Construção passaram a compreender a inovação e tecnologia como um caminho necessário para a renovação dos negócios e desenvolveram algum tipo de programa de conexão com startups. A primeira leva de programas de inovação, surgida em 2016 e 2017 já passou por um ciclo inicial de amadurecimento e passa a ter objetivos claros e áreas de interesse, o que indica que muitas empresas estão se preparando para caminhos de aquisição.
O que percebemos é que a curva de inflexão está se aproximando em um ponto onde a maturidade das construtechs e proptechs e a busca por inovação de incumbentes está a ponto de criar a base para um mercado de aquisições. Com a característica de um mercado ainda jovem, nos próximos dois anos veremos ainda mais empresas em estágios iniciais de tração serem adquiridas e as primeiras aquisições por players estabelecidos. E provavelmente em menos de cinco anos começaremos a ver grandes operações acontecendo.
Marcus Vinícius Anselmo é colaborador e parceiro do BNZ Innovation. É entusiasta e especialista em Construtech, Protechs e inovação na cadeia da Construção e foi um dos idealizadores do Construtech Ventures além de executivo em empresas como Softplan, Totvs e Datasul. Bacharel em Ciências da computação pela UFSCar com MBA Executivo pela Fundação Dom Cabral e pós-graduação em marketing pela GV, tem mais de 20 anos de experiência em tecnologia. Hoje atua por sua empresa, Terracotta Ventures com investimentos e advisoring em inovação.
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