capa artigo aprendizados não óbvios sobre liderança da minha trajetória na ClearSale capa artigo aprendizados não óbvios sobre liderança da minha trajetória na ClearSale

Publicado em: 04 de dezembro, 2023
Bernardo Lustosa

De 2007 a 2023 eu trabalhei na liderança da ClearSale. Até 2018 como uma espécie de COO e a partir daí como CEO até pouco depois do IPO. Eu nunca havia sido gerente até entrar na ClearSale. E nunca fui. Como era uma pequena startup, eu saltei todas estas etapas e tudo que eu aprendi, foi vivendo na prática, com mentores, empreendedores, colegas da empresa, erros, acertos e vivências anteriores.

Escrevi esse artigo para compartilhar o que acredito e o que não está nos livros. Trata-se, portanto, da minha visão, que pode ser útil para líderes em diferentes estágios de empresa.

A Liderança é, antes de qualquer coisa, ser autêntico

Ninguém é perfeito, as pessoas têm virtudes, defeitos, coragem e medo em momentos diferentes, alegrias e problemas pessoais. Um líder também é assim, humano. 

E o maior erro que pode cometer como líder é colocar uma máscara de “a pessoa perfeita”. Ao ser integral, com virtudes e defeitos, ao comunicar isso de forma transparente e no seu estilo natural, o líder gera uma empatia muito grande. Seus colaboradores vão te ver como uma pessoa acessível, pois os verão como elas mesmas, assim vão ver possibilidade de crescimento, pois veem no seu líder alguém que tem problemas, como ela. Elas também serão mais abertas e a comunicação acontecerá fluida na empresa. 

Uma pessoa autêntica é muito mais interessante e inspiradora. No livro Unusually Excelent, este é dado como o princípio básico número 1 do líder.

A cultura é o que você faz ou tolera

Essa frase foi proferida pelo Paulo Lalli em uma palestra na ClearSale e eu levei para a vida. Em muitas mentorias que eu dou, as pessoas me perguntam como criar uma cultura na sua empresa. Minha resposta, para a surpresa de quem pergunta, é sempre a mesma: “Sua empresa já tem uma cultura. E ela é o que você faz ou tolera”

Toda organização, seja uma empresa, uma tribo, uma repartição pública, a academia, etc. tem uma cultura. E cada área acaba tendo uma sub-cultura. Tudo isso sem que ninguém tenha escrito uma frase sequer na parede ou na intranet. 

Vou dar um exemplo simples, mas que ilustra bem o tema e pode ser amplamente estendido: Se você é uma pessoa que se atrasa para reuniões, você criará uma cultura em que as pessoas se atrasam para as reuniões e isso se transformará em algo normal na empresa. O mesmo acontece se você tolera os atrasos, sem nunca pedir ou advertir quem está se atrasando. Em uma reação em cadeia, este líder também se atrasará para as reuniões dele, e isso se espalhará para toda a empresa. 

Logo, pense duas vezes sobre a tolerância com performance ruim, sobre o tipo de piada que você faz, sobre a importância que você dá para a qualidade. A forma com que você lida com isso molda toda a cultura. Não adianta escrever “Foco em Resultado” na parede e tolerar uma pessoa que não entrega.

Quer ter uma empresa legal? Tenha empatia com o seu passado

A maioria dos empreendedores já trabalhou em outras empresas ou organizações, já foi analista, office-boy, assistente, etc. Lembre-se de tudo o que você via errado nessas empresas. Muito do que eu aprendi e levei para a ClearSale foi o oposto do que eu vivenciei em empresas que trabalhei. Eu me lembro do quanto era irritante bater o ponto, quando eu era alguém que pensava no melhor da empresa o tempo inteiro

Lembro o quanto eu me frustrava por ser o melhor da área e não ter uma promoção porque não estava no prazo do RH. Eu me lembro de terem me dito que, “da porta pra fora, eu poderia ser quem eu sou, da porta para dentro, eu teria que me comportar, ser obediente à hierarquia, ser amável e sorridente, sempre”. Isso nunca foi dito na ClearSale. Nós dizemos: seja você mesmo. Todo profissional é antes de tudo, uma pessoa.

As pessoas não tem que cumprir ordens, tem que sentir a mesma dor que você

Peter Drucker escreveu a seguinte frase adaptada: “Um líder tem que fazer com que o liderado faça o que tem que ser feito para a empresa, porque ele quer”. A melhor maneira de colher o pior trabalho é dar uma ordem. Ao invés disso, explique para a pessoa a dor que ela estará resolvendo e como isso está, direta ou indiretamente, conectado com o propósito maior da empresa. Esta é uma forma de inspiração. Você se surpreenderá com os resultados e saberá distinguir as pessoas que realmente tem ownership.

Muita gente quieta sabe mais que faladores

Eu já escrevi um artigo inteiro sobre isso. Muitas e muitas vezes, na minha vida, eu vi reuniões onde a retórica, o falar bem, o famoso storytelling convencer toda a sala de uma ideia que simplesmente não para de pé, racionalmente. Nessas mesmas reuniões, eu via pessoas introvertidas, muitas vezes técnicos, que por sua natureza não pediam a palavra, sinalizando negativamente com a cabeça no canto da mesa. Provavelmente esta pessoa tinha certeza de que a ideia sendo proposta não daria certo, não seria exequível ou coisa parecida. Mas ele não foi ouvido. 

Procura dividir o tempo de fala entre todos os que entendem do assunto. Ignora a hierarquia. Ideias não tem crachá.

Seu tempo é sua vida. Não o desperdice com coisas ruins

Numa aula de Harvard de um curso preparado para Empreendedores Endeavor, um professor indiano (já pesquisei muitas vezes e não consegui achar quem era) nos propôs o seguinte exercício. Estime quantas semanas você ainda vai viver e coloque este número na geladeira. A cada semana, retire este papel e o próximo mostrará que você tem uma semana a menos. 

Qual o sentido disso? Tangibilizar a finitude da vida. Sabe aquela parceria que você sabe que não vai dar em nada? Cancele. Sabe aquela pessoa que não te agrega e que não quer crescer? Apague da sua vida. Sabe aquela palestra sobre o tema da moda? Não vá. Sabe aquela reunião de próximos passos que você marcou só por educação? Nunca mais faça isso. Sua vida vai acabar e você estará fazendo isso. Não começa o dia respondendo emails ou whatsapps. 

Construa a sua agenda. Não deixe que a agenda construa você. E que seja a mais breve possível. Você tem uma vida.

Só aceite ser medido pela régua de quem você admira

Eu passei muito tempo na minha vida pensando “o que vão pensar de mim se eu fizer tal coisa?”. Não vou dizer que isso é totalmente inútil. Para mim, a questão é: quem vai pensar? Quem vai te avaliar? Essa é uma pessoa na qual você se inspira ou que você admira? Se for, a reflexão pode ser útil. Mas o contrário é uma imensa perda de tempo e gera uma ansiedade enorme, porém desnecessária. 

Aceitar ser “medido” por uma régua torta significa nunca saber o seu real tamanho. 

Há pessoas que não tem capacidade e nem mérito para te medir, em alguma dimensão ou em nenhuma. Não perca tempo com essas avaliações. Se não é uma pessoa que você admira em suas capacidades ou como pessoa, esqueça o que ela falou ou pensou de você. É libertador.

Todos têm problemas, olha a resultante

Todos tem problemas, você não tem? Tem gente com o filho doente, com uma dor crônica, que por vezes respondem atravessado (adoro), que são sarcásticas, que tem depressão, que são viciadas em redes sociais, que andam mal arrumadas, que tem dependência química, que parecem ausentes, tem gente com toda a sorte de problemas, assim como você. 

É importante lembrar que muitas vezes elas nem sabem dos problemas que têm, pode ser algo do inconsciente que ela nem tem noção. Outras vezes são problemas que elas lutam árdua e diariamente para resolver, mas simplesmente não conseguem, ou ainda não conseguiram. 

Seu trabalho não é julgar, é liderar. Se essa pessoa sente as mesmas dores da empresa que você e, ao fim, entregam acima do esperado, ela merece todo o seu respeito e tem lugar na sua empresa, desde que sejam éticas, tenham compromisso e sejam respeitosas com os demais. Ao invés de julgar os atos, julgue a resultante. Ofereça ajuda, quando possível e sempre que solicitado.

O profissional é uma pessoa. Faça trocas na balança pessoal

Eu tive um funcionário e amigo que era obcecado pelo Corinthians (não sou Corinthiano). Seu líder, no início, ficava indignado ao vê-lo saindo na quarta-feira mais cedo por causa do time do coração. Foi então que aprendemos algo simples, mas poderoso. Se ele tivesse a liberdade de poder ter o seu “tempo do timão”, ele viraria noites, quando necessário, pela empresa. Como a maioria das empresas não atua desta forma, ele criou grande fidelidade pela empresa. Fez uma linda carreira e, até onde eu sei, toda quarta ele ainda sai mais cedo.

Pouquíssimas pessoas saem de casa com a intenção de fazer um trabalho ruim. Confia!

No meu painel internacional de aprovação como Empreendedor Endeavor, um VP da Dell disse essa frase. Antes de pensar que uma pessoa é “ruim” ou mal intencionada, pense na frase acima. 

É natural alguém sair de casa para atrapalhar a empresa? Se você acreditar que esta chance seja baixa, será que não tem nada no ambiente dela que está fazendo com que sua produtividade esteja baixa, que tire a motivação, que destrua seu trabalho? Ela sabe porque está fazendo o que está fazendo? Tem capacidade? Uma investigação mais profunda nos ajuda a descobrir problemas, muitas vezes, estruturais na nossa empresa.

Publicação Original


0 comentário

Deixe um comentário

Avatar placeholder