Em 1949, Joseph Campbell mudava o jeito de contar histórias. Ele criou  uma estrutura padronizada de storytelling chamada A Jornada do Herói – ou da Heroína, que se tornou um  modelo para explicar os passos da história de uma protagonista ou de um protagonista em obras narrativas. 

A ideia apresenta uma forma cíclica de contar histórias, em que a personagem central ou o protagonista supera seus vários desafios para se tornar um exemplo para as próximas gerações. 

Christopher Vogler, um importante roteirista de Hollywood, adaptou a obra O Herói de Mil Faces, de Campbell, e escreveu A Jornada do Escritor: Estrutura Mítica para Roteiristas, no qual identificou e sugeriu um padrão nas histórias das protagonistas e dos protagonistas contemporâneaos mais inspiradores que conhecemos e adoramos: Neo, Homem-Aranha, Luke Skywalker, Mulher Maravilha e Supergirl. 

“Um herói lendário é normalmente o fundador de algo, o fundador de uma nova era, de uma nova religião, uma nova cidade, uma nova modalidade de vida. Para fundar algo novo, ele deve abandonar o velho e partir em busca da ideia-semente, a ideia germinal que tenha a potencialidade de fazer aflorar aquele algo novo.” (Campbell)

Neste contexto, podemos mudar o herói ou a heroína pelo empreendedor ou pela empreendedora, que ao fundar sua empresa se joga em uma jornada desconhecida e cheia de desafios que beiram ao impossível: Steve Jobs, Elon Musk, Samuel Klein e Luiza Helena Trajano.

Esta narrativa de jornada se divide em 12 fases, a saber:

  1. O Mundo Comum: a vida da personagem é monótona, porém com grandes indícios de que algum problema precisa ser solucionado – e aqui a analogia entre as jornadas é perfeita, já que uma empreendedora ou um empreendedor, na maioria das vezes, começa pela vontade quase inexplicável de resolver um problema;
  2. O Chamado à Aventura: uma missão que tira o protagonista ou a heroína da sua zona de conforto, com um apelo irrecusável para o atingimento de seus objetivos;
  3. Recusa do Chamado: a resistência ocorre primeiramente por medo, insegurança e obrigações que mantêm a personagem no mundo comum – sendo este um ponto central na vida da empreendedora ou do empreendedor que começa a trilhar seu caminho para abrir um negócio, pois manter um padrão razoável de vida, pagar as contas mensais, passar pela possibilidade de perder estabilidade financeira ou ter que cuidar dos filhos são os principais motivos de desistência;
  4. Encontro com o Mentor ou a Mentora: no momento em que falta uma ajuda ou um empurrão final para a decisão de iniciar sua missão, aparece o mentor ou a mentora com grandes ensinamentos e inspiração sobre o caminho a ser trilhado, com grandes exemplos na cultura pop, como Mestre Yoda ou Sr. Miyagi – organizações como a Endeavor ajudam a acelerar esse processo de mentorias. Eu mesmo, na minha jornada, pude contar com grandes mentores que foram essenciais para eu conseguir chegar até aqui;
  5. A Travessia do Primeiro Limiar: o mundo que o herói ou a heroína precisa desbravar ainda é pouco conhecido, e neste momento uma fronteira é cruzada para encarar os principais desafios – quem sabe o primeiro cliente, o primeiro investimento feito por investidores-anjos, o primeiro milhão conquistado, etc;
  6. Provas, Aliadas e Inimigos: vários obstáculos e contratempos surgem logo nos primeiros passos do caminho a ser trilhado, como acidentes, inimigos, armadilhas e imprevistos, preparando o protagonista ou a protagonista para o que há por vir – sendo este caso uma constante na vida da empreendedora ou do empreendedor, que precisa lidar diariamente com as burocracias, impostos e concorrentes.;
  7. Aproximação da Caverna Secreta: um esconderijo ou um refúgio dentro de si para rever seus principais dilemas e enfrentar novamente os medos que atrapalham sua missão – o empreendedor ou a empreendedora, na maioria das vezes, interrompe a jornada para refletir sobre os reais perigos da caminhada e repensa seus passos, porém, de acordo com Campbell, “a caverna que você tem medo de entrar guarda o tesouro que você procura“. Importante parar para depois seguir em frente;
  8. A Provação: o momento mais difícil da Jornada, seja ao enfrentar um desafio extremamente poderoso ou passar por um conflito interior devastador, que abala profundamente o seu estado físico e mental. Uma experiência de quase morte – e na vida do empreendedor ou da empreendedora sabemos que, de acordo com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), cerca de 1/3 das empresas fecham as portas em menos de 5 anos;
  9. A Recompensa: o momento da recompensa, que pode ser qualquer elemento de valor para comemoração. Deve ser breve, pois o herói ou a heroína ainda precisará de muita força e ânimo para seguir até o final – curtir a jornada é importante e ajuda a manter a motivação para seguir em frente, mas o caminho ainda será longo; 
  10. O Caminho de Volta: essa fase é onde me encontro agora, após o Exit da D1,  startup que fundei. Um momento de reflexão profunda, pois a sensação de perigo foi substituída pelo sentimento de missão cumprida, aceitação da fase e reconhecimento pelos demais. Entra em cena a necessidade de escolha entre a realização de um objetivo pessoal ou um bem coletivo muito maior – um exit, a venda da sua companhia ou mesmo um IPO não são o fim da jornada, mas apenas um momento de reflexão para continuar na missão;
  11. A Ressurreição: aquele momento em que o desafio ressurge das profundezas para uma provação épica – o ressurgimento dos desafios que ficam cada vez maiores. Os chamados Second-Time Founders normalmente aceitam inspirações maiores, com riscos proporcionais. Não interessa mais nada pequeno. O sonho grande fica maior ainda;
  12. O Retorno com o Elixir: acontece uma revolução no seu mundo comum, oferecendo uma lição final ao público – a moral da história e o exemplo para a comunidade e para as próximas gerações. O exemplo que precisa inspirar e manter sucessores seguindo na mesma missão.

Na minha história empreendedora, passei por estas fases, que podem ser revistas neste artigo que escrevi para o portal da Endeavor. 

E agora, após a conclusão e saída definitiva do negócio que fundei, encontro-me no passo 10 da Jornada do Empreendedor, O Caminho de Volta, caracterizado por um enorme sentimento de missão cumprida, aceitação do momento presente e reconhecimento pelos demais membros das comunidades que participo. E outra coisa muito importante: a bagagem conquistada nas últimas décadas e os recursos disponíveis agora são bem maiores do que quando eu comecei a minha jornada empreendedora, sem praticamente nada, em meados dos anos 2000.

“Se consegue ver seu caminho demarcado passo a passo diante de você, você sabe que aquele não é seu caminho. Seu próprio caminho você faz com cada passo que dá. É por isso que ele é o seu caminho.” (Campbell)

Uma coisa é certa: é isso que eu amo fazer, é isso que eu sei fazer e é isso que eu farei. Estou voltando para o meu caminho, para ressurgir e revolucionar outro mercado cheio de grandes problemas e retornar um dia com o tão almejado “elixir” transformador.

Fica a dica para outros e outras empreendedoras interessadas em começar uma missão: a aventura é dura e cheia de altos e baixos, mas a jornada precisa ser curtida independente dos percalços que certamente virão, pois estas 12 fases são cíclicas e não vão parar de girar na sua vida.

Campbell explica sabiamente que “precisamos estar dispostos a nos livrar da vida que planejamos, para podermos viver a vida que nos espera. A pele velha tem que cair para que uma nova possa nascer“.

Somos empreendedores e empreendedoras da nossa própria história. Diga um estrondoso sim para a sua aventura. A minha está só começando, novamente.

O post O caminho de volta — após o exit aparece em Endeavor Brasil.

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