* Por Rodrigo Scotti

Dois eventos que participamos no 2º semestre de 2019 nos fizeram refletir sobre o mercado nacional de chatbots e os processos de consolidação experimentados nos últimos anos. O termo ‘chatbot’ tem sido usado à exaustão atualmente, o que pode nos dar a impressão de que utilizar um robô para atender clientes é algo que é corriqueiro, que sempre esteve entre nós. No entanto, a familiaridade das empresas e das pessoas com os chatbots é um fenômeno bastante recente, coisa de três anos atrás. Foi quando o Facebook abriu suas ferramentas para o mercado e fez com que o assunto fosse abordado pela mídia com mais frequência. Nesta época, minha startup concluía seu segundo ano de operação, focada no desenvolvimento e manutenção de ferramentas próprias de inteligência artificial.

No decorrer dos últimos anos, percebemos que o nível de conscientização por parte das empresas que nos procuram para contratar as soluções evoluiu muito em pouco tempo. Elas superaram o uso inicial, apenas para suporte ao consumidor, e hoje utilizam bots para diversos casos, desde automação de processos ao pós-venda. Já provaram o gosto da economia gerada por um bot de suporte, que consegue livrar sua equipe das tarefas mais maçantes e fazer com que o colaborador humano possa se dedicar a ações mais estratégicas. Agora, as empresas querem mais: o próximo passo é ir além de usar a ferramenta apenas para economizar, mas também fazer com que o chatbot protagonize geração de receita e conversão em vendas.

Publicada recentemente, a mais nova edição do Ecossistema Brasileiro de Bots revela que o volume de bots já criados no Brasil mais do que triplicou de um ano para cá: 61 mil chatbots e voicebots, contra 17 mil citados na edição anterior da pesquisa. O tráfego de mensagens também cresceu: 1 bilhão de conversas mensais com bots, atualmente, contra cerca de 800 mil em 2018. Estudo mostrou que a maioria dos desenvolvedores trabalham tanto com bots de texto como com bots de voz – 65% das empresas participantes do estudo. As que trabalham exclusivamente com bots de texto são apenas 32% e comente com bots de voz, 3%.

O mapa ainda indica que há uma expectativa do mercado sobre a abertura do Whatsapp para opções de pagamentos e a tendência de crescimento no uso de bots de voz, seja por telefone seja por assistentes de voz como Alexa, Siri ou Google Assistente.

Sabemos que, apesar da evolução do mercado, a maior parte dos chatbots desenvolvidos no Brasil ainda permanece focada no suporte ao consumidor. No entanto, como dissemos, não faltam funcionalidades para os sistemas mais complexos, que podem ser focados em vendas, RH, automação de processos internos, entre outras funcionalidades.

Estas ferramentas com base em inteligência artificial também são essenciais para auxiliar o humano durante o serviço e permitir integrações customizadas aos sistemas corporativos. Conseguimos verificar uma melhora substancial na qualidade do atendimento prestado quando o aprendizado de máquina é feito combinando com análises da experiência e do desenho conversacional.

Hoje, temos no Brasil a 2ª maior comunidade de pessoas interessadas em bots do mundo: a Chatbots Brasil. Conforme observa Caio Calado, cofundador da comunidade e um dos mais atuantes no segmento, hoje a comunidade Chatbots Brasil está batendo a marca de 12 mil pessoas, o que fez com que a inteligência artificial, o machine learning e a possibilidade de desenvolver chatbots atingisse os cérebros de muitos profissionais, hoje desenvolvedores, que não tinham planos de atuar no segmento. Calado aponta que, melhor do que ninguém, o mercado brasileiro de chatbots está orientado a casos de uso: empresas nacionais desenvolveram produtos para indústria específicas e foram bem sucedidos em entender as necessidades de cada uma delas.

Ricardo Blumer, que também é membro participante da comunidade desde seu início também comenta o assunto, defendendo que, quando é necessário falar sobre o mercado nacional de chatbots, é preciso dividi-lo em dois eixos principais: técnico e de produto. No técnico, estamos um pouco atrás dos outros países, já que a compreensão em linguagem natural é fator primordial para a evolução nesta esfera, e a maioria das plataformas foi construída baseadas na língua inglesa. No entanto, quando o assunto é o potencial de inovação e a qualidade do desenvolvimento, fazemos acontecer. Blumer acredita que o próximo passo do mercado seja o aprimoramento das interfaces de voz e da complexidade do conteúdo produzido por UX writers.

Quando começamos a desenvolver bots, não havia esse ambiente. Precisávamos construir do zero a plataforma e os bots para nossos clientes. O caminho que a gente percorreu como desenvolvedor de plataforma foi extremamente importante não apenas no sentido de aprender e validar a solução de forma empírica, mas também de descobrir a melhor forma de desenvolver este sistema, de acordo com tudo o que permeia a realidade brasileira.

Pietro Bujaldon, que, como eu e Blumer, também empreende no setor e participa do grupo Chatbots Brasil desde sempre, concorda conosco que, no caso dos empreendedores brasileiros, a troca de informações é mais fluida. Entendemos que o mercado é gigantesco e que há espaço para todo mundo. É como ele diz: sentamos todos em uma mesa de bar e trocamos ideia, compartilhamos experiências, não falamos nomes de clientes em específico, nem revelamos o molho do big mac, mas trocamos muita coisa que nos ajuda mutuamente. Bujaldon acredita que, após a consolidação, os próximos lugares para o qual o mercado caminha envolve fusões e aquisições.

Hoje, em minha startup, compreendemos que o mais eficaz é focar no mercado profissional, nos especialistas que atuam nele, construindo ferramentas para automatizar e integrar bots aos sistemas das empresas, além de ampliar potencialmente o foco nas ferramentas para os desenvolvedores. Entendemos que ter uma operação contando com bots de atendimento ou para processos internos está virando commodity e que, em curto espaço de tempo, estará integrado de forma intrínseca a qualquer empresa, independente do segmento.

* Rodrigo Scotti é CEO da Nama, primeira empresa no país a desenvolver uma plataforma proprietária de inteligência artificial para robôs de atendimento e cofundador da ABRIA – Associação Brasileira de Inteligência Artificial. 

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