Carlos Melles defendeu maior abertura dos bancos para conceder empréstimos aos micro e pequenos negócios no país

O presidente do Sebrae, Carlos Melles, concedeu entrevista exclusiva para o jornal mineiro “O Tempo”, na tarde desta segunda-feira (24/8). A live, conduzida pelos jornalistas Helenice Laguardia e Frederico Duboc, tratou sobre os principais impactos do coronavírus sobre os pequenos negócios. Melles expôs o trabalho feito pelo Sebrae durante a crise provocada pela pandemia e afirmou que um dos principais desafios para os empreendedores é acesso a crédito. “O mais importante, além dos protocolos de retomada das atividades, é o crédito para os empresários se manterem vivos”, disse o presidente.

Confira a seguir a entrevista completa:

O Tempo: Sabemos que o papel da micro e pequena empresa na economia brasileira é crucial, estudos mostram que as receitas geradas por esse segmento são responsáveis por 27% do PIB nacional, como você avalia o impacto da pandemia nesse setor?

Eu costumo dizer que as MPE são um dos tecidos mais importantes da nossa economia. Estamos falando de quem gera mais de 50% das carteiras assinadas de todo o país. É uma fatia muito grande da cadeia produtiva. Logo no início da pandemia, o Sebrae foi para rua, pegou na mão do pequeno negócio e se colocou à disposição dos empresários. Nós sabíamos que a crise viria. A prioridade, no primeiro momento, era preservar a saúde, em seguida os empregos. Agora, com a retomada gradual das atividades em algumas regiões, lançamos os protocolos com normas de segurança para guiar os empreendedores. O impacto foi grande. As vendas chegaram a cair 80% em alguns negócios. Apuramos que os setores mais afetados são bares, restaurantes, turismo e serviços. De modo geral, as pesquisas apontam que temos que nos preocupar muito, pois é um setor que emprega milhares de pessoas. Nesse momento, o principal desafio que o Sebrae enxerga para os pequenos negócios é o acesso ao crédito. O mais importante além dos protocolos de retomada das atividades, é o crédito para os empresários se manterem vivos. No ano de 2019, focamos em nos tornar o Sebrae que o Brasil precisava, o plano era fazer com que a participação dos pequenos negócios na economia saltasse dos 27% do PIB para 40%. Com isso, nós estimulamos a compra dos pequenos. Infelizmente a crise chegou. Avalio que nós estamos conseguindo apoiar os empreendedores com as diversas iniciativas que tomamos.

O Tempo – Falando sobre crédito, há pesquisas do Sebrae que mostram que 54% dos empresários pediram crédito, mas mais da metade não conseguiu, como você explica isso?

Exagerando um pouco para me tornar claro, eu digo que o sistema financeiro está adoentado. Uma das coisas mais complicadas para as pequenas empresas é acessibilidade ao crédito, isso acontece em todo o mundo, mas percebo que no Brasil é ainda pior. Antes da pandemia 50% procurava crédito, outros 50% não buscava. Dos que procuravam crédito, apenas 8% conseguiam. Hoje esse número, dos que conseguem, chega a 28%. Melhorou, mas ainda não é satisfatório. Não há vontade do sistema financeiro em fazer dar certo o empréstimo para os pequenos negócios. O Sebrae tem o Fampe que é voltado somente para os pequenos negócios. Em 60 dias chegamos a R$ 2 bilhões de empréstimos. No começo da pandemia, identificamos 27 linhas de crédito nos bancos, hoje temos 180 linhas de crédito. Foi um salto formidável. O cardápio aumentou, mas o acesso ainda é ruim. Temos muito que melhorar nesse sentido.

O Tempo – Há estimativas de que seriam necessários R$ 200 bilhões em crédito para os pequenos negócios, na sua opinião esse dinheiro vai chegar na mão dos empreendedores?

O ideal seria se pelo menos 30% dos que pedem acesso ao crédito tivessem êxito. O governo federal tem trabalhado para ajudar os micro e pequenos negócios. O benefício emergencial ajudou muitos MEI com os R$ 600 mensais. O recurso foi bem distribuído. Nesse mesmo sentido, veio a linha de crédito do Pronampe, apoiada pelo senador Jorginho Melo (PL). O Pronampe é voltado para apoio a micro e pequena empresa. Colocamos R$ 27 bilhões em empréstimos para girar. Alguns dos benefícios é que ele garante até 100% do dinheiro tomado, possui juros muito civilizados, um prazo de carência e prazo para pagamento suportável. Eu diria que qualitativamente é um programa perfeito. Inclusive é somente para empresas regulares junto à Receita Federal. Agora quantitativamente, ele ainda atinge pouco. Precisamos buscar mais recursos. Estamos trabalhando com alternativas interessantes, com o que chamamos de empresas âncoras. Tais como Renner, Malwee, Magazine Luiza… Esses grandes produtores fazem parcerias com distribuições para os pequenos negócios. É um encadeamento produtivo: temos um grande distribuidor que possui linha de crédito e pode dividir esses valores. Também estamos fazendo estudos para dar visibilidade aos produtos dos pequenos negócios. Lançamos o Mercado Azul, que funciona como uma vitrine online. O Sebrae está plenamente consciente de que para ajudar os pequenos negócios precisa fazer parceria.

O Tempo – Em torno de 35% dos negócios ainda não fazem vendas pela internet, principalmente fora dos grandes centros, como o Sebrae trabalha isso?

Realmente ainda há atraso no acesso. Isso é um problema social. Aparelhar os pequenos negócios e popularizar o acesso à internet é uma das nossas prioridades, porque sabemos que com isso a capacidade produtiva das empresas aumenta exponencialmente.  A tecnologia é positiva para o crescimento de qualquer negócio. Os cursos online do Sebrae cresceram em mais de 160% durante a pandemia. Nós ofertamos uma série de conteúdos gratuitos para ajudar na formação e especialização dos empreendedores. Há serviços novos que estamos oferecendo, como o UP Digital, que capacita o empresário para tornar e empresa digital em apenas cinco dias. Queremos usar a capilaridade do Sebrae para verdadeiramente entrarmos na era digital.

O Tempo- O que as empresas podem fazer para se reerguer e qual é a força do Sebrae dentro desse contexto?

Estamos trabalhando em diversas frentes de atuação: treinamentos e cursos online para dar suporte ao empreendedor, protocolos de retomada para orientar de forma gratuita e segura a retomada dos negócios e – prioritariamente – trabalhamos maneiras de facilitar o acesso ao crédito que é a bandeira mais importante para garantir a saúde das empresas. Os números nos surpreendem. Na 5ª pesquisa realizada pelo Sebrae percebemos que a queda no faturamento não tem piorado. Na pesquisa seguinte, já há sinal de otimismo. A 6ª pesquisa mostra que as vendas estão retomando aos poucos, as pessoas estão mais esperançosas e usando bastante os protocolos de retomada das atividades. O Sebrae se preocupa com a saúde dos brasileiros e com os empregos. Precisamos aumentar a produtividade das micro e pequenas empresas. Estamos focando no pouco apetite desse setor para a exportação, temos cursos e serviços para elevar esse tipo de negócios.

 O Tempo – A burocracia para exportação ainda é um problema, os custos para vender para fora são grandes. Como o empresário pode superar isso?

A cooperação funciona muito bem. Quando você vai exportar você precisa ter qualidade e escala para ofertar o produto por um bom tempo. Para se ter ideia, os bancos cooperativos têm emprestado quase duas vezes mais do que os bancos comuns. A exportação é mais um ato de uso e costume. Estamos trabalhando junto ao Governo Federal para desburocratizar a exportação. Na parte tributária já melhorou muito, com a reforma tributária acredito que irá melhorar mais ainda. Nós queremos efetivamente colocar o artesanato brasileiro no mundo. A Itália é um dos exemplos para o Brasil. Eles valorizam muito os produtos feitos à mão.

O Tempo – O que esperar do Brasil nesse momento que estamos vivendo? O que o Sebrae pode fazer nesse sentido para tornar o ambiente mais amigável para os pequenos empresários?

Estamos sonhando com uma retomada em V e não em U. O aprendizado com a pandemia é muito amplo, o sofrimento nos fez aprender. Mas tenho a impressão que com a descoberta da vacina, vamos retomar as atividades com muito mais conhecimento e maturidade. O Sebrae atua para melhorar a produtividade dos empreendedores. Também oferecemos recursos para incentivar o crescimento de quem trabalha com inovação no país. O trabalho do Sebrae é muito sintonizado com o que as micro e pequenas empresas demandam. Temos buscado ter uma proximidade com os governadores para colocar o Sebrae a disposição das diversas iniciativas públicas. O Sebrae tem uma capilaridade que ajuda bastante. Estamos em todos os cantos do país. Temos um corpo de profissionais muito qualificado e disposto a colaborar. Acredito que tudo isso contribui para sermos apoiadores e incentivadores dos micro e pequenos negócios.

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