No Brasil, há 10,1 milhões de agricultores familiares, o que representa 23% do valor bruto da produção agropecuária. Se formasse um país, esse segmento seria 8º maior produtor de alimentos do mundo. Os dados são do anuário de 2023 da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag).
Agricultura familiar brasileira é a principal responsável pelo abastecimento do mercado interno, com produtos saudáveis e manejo sustentável dos recursos ambientais, nesse formato, tanto a produção de alimentos quanto a gestão da propriedade ficam a cargo da família.
Além da produção de alimentos em si, outra contribuição das propriedades familiares dá gás na economia. De acordo com a Contag, a agricultura familiar responde por 40% da renda da população economicamente ativa de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes, que representam 68% do total do país.
Ao trabalhar em uma consultoria agrícola, Caroline Pimenta e Juliane Blainski perceberam que alcançar todos os agricultores familiares do Brasil levaria tempo. Com o desejo de gerar impacto de forma rápida, surgiu a ManejeBem, fundada em fevereiro de 2018, plataforma que cria uma rede de conexão entre produtores, técnicos e indústrias em pro de uma agricultura mais sustentável.
“Nesta época nós estávamos no último ano do doutorado na Federal de Santa Catarina. Nós sabíamos que muitas das publicações que fazíamos não chegavam até o produtor de fato. Foi então que criamos a ManejeBem, com o intuito de gerar conhecimento de forma escalável para o produtor”, explica Juliane.
As fundadoras sabiam que a tecnologia seria a melhor maneira de alcançar em larga escala os produtores familiares. Desta forma, poderiam transformar algo tão caro e inacessível, em algo que estivesse disponível diariamente para o trabalhador. “Acreditamos que a comunicação rural é a chave para impulsionar a agricultura sustentável e o desenvolvimento humano nas comunidades rurais, e que essa comunicação deve ser feita com base no diálogo e participação, permitindo que o produtor expresse suas opiniões, compartilhe conhecimento e participe ativamente na produção da informação”, analisa Juliane.
Desafios iniciais da ManejeBem
A startup enfrentou desafios iniciais significativos, especialmente relacionados à conectividade. A falta de internet nas áreas rurais ainda é uma realidade, e mesmo com avanços tecnológicos, a instabilidade e a baixa velocidade de internet persistem. No entanto, a ManejeBem não deixou esses desafios serem obstáculos.
Diante da falta de conectividade, a ManejeBem adotou diferentes canais para oferecer assistência técnica e extensão rural remota. A startup opera por meio de uma central de telefone, SMS e rádio, garantindo que a falta de internet não impeça os agricultores de acessarem informações valiosas. Além disso, a startup está constantemente buscando novas tecnologias para aprimorar suas soluções, demonstrando um compromisso contínuo com a inovação.
Soluções na prática: Tecnologia para sustentabilidade
A ManejeBem tem soluções para medir, monitorar e rastrear impactos sociais, econômicos, ambientais e agronômicos em comunidades rurais. Através da Escala de Sustentabilidade ManejeBem (ESM), a startup avalia o nível de sustentabilidade de unidades de produção familiar ou comunidades rurais.
O Software ESM coleta dados, realiza análises e fornece uma avaliação precisa do nível de sustentabilidade, considerando o bem-estar humano e ecológico. Os indicadores são visualizados, e a inteligência artificial é consultada para obter sugestões de soluções personalizadas. O resultado é um plano de desenvolvimento do produtor, concentrado em educação, assistência técnica e extensão rural.
Essas soluções não apenas contribuem para o aumento da renda familiar dos produtores em até 300%, mas também promovem práticas agrícolas sustentáveis, melhorando em média 27% o número de práticas agrícolas sustentáveis aplicadas em unidades de produção, com destaque para a melhoria nos manejos do solo, culturais e fitossanitários.
Hoje a startup está com 19 projetos em execução. “Desde o nosso início, já impactamos mais 1 milhão de produtores direta e indiretamente, com a execução de 33 projetos. Auxiliando grandes clientes, como a Vale e a Ambev, no atingimento de suas metas de sustentabilidade”, comenta a fundadora. Os produtores podem usar a plataforma de forma gratuita e o serviço é financiado por grandes empresas de alimentos e bebidas, além de órgãos públicos e mineradoras, interessadas em cumprir suas metas ambientais, sociais e de governança (ESG).
A parceria entre a ManejeBem e as empresas-clientes não se limita apenas à implementação de projetos. A startup oferece suporte, desde a fase inicial de planejamento até a execução e monitoramento contínuo. Além disso, assume a responsabilidade de garantir que os projetos de compensação ambiental e social não sejam apenas cumprimentos de obrigações, mas também oportunidades para gerar impacto positivo real.
IA na agricultura
Em 2023, a ManejeBem deu um passo significativo ao implementar um projeto de Inteligência Artificial na forma de avatares. Com nomes como Maya, Bento e Lisa, esses avatares são gerenciados por uma equipe especializada, composta por agrônomos e pedagogos, responsáveis pelos serviços de atendimento agronômico.
Os avatares permitem que os produtores rurais, através do ManejeChat, interajam, façam perguntas, compartilhem conquistas e recebam conselhos sobre práticas agrícolas. Além disso, os algoritmos de IA analisam dados em tempo real, identificando padrões e prevendo problemas, proporcionando uma tomada de decisão mais informada. A cada interação, os avatares e os especialista aprendem mais sobre o produtor rural e suas necessidades específicas, permitindo-lhes oferecer assistência personalizada e orientações precisas.
A ManejeBem vislumbra um futuro em que esses avatares assumirão a responsabilidade por mais de 50% dos atendimentos técnicos realizados pela equipe da startup. “A aplicação da IA na transformação digital dos produtores rurais tem o potencial de trazer melhorias substanciais em várias áreas da agricultura, promovendo uma comunidade rural forte e resiliente”, reforça Juliane.
Os próximos passos da ManejeBem envolvem o desenvolvimento de novas tecnologias para automatizar e ampliar ainda mais seus produtos e serviços. A startup almeja impactar produtores rurais em outros países da América Latina nos próximos anos. E para 2024, a companhia prevê faturamento de R$ 7 milhões, além dos investimentos já recebidos pela Bossa Invest e Agroven.
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