*Por Luiz Costa

Por muito tempo, a inovação na administração pública foi vista como um desafio quase intransponível. A burocracia, marca registrada de muitos serviços públicos brasileiros, alimentou a ideia de que transformar a gestão municipal seria uma tarefa árdua e complexa. No entanto, essa percepção começa a perder força. Nos últimos anos, diversas iniciativas vêm provando que inovar no setor público local é não só possível, como mais simples do que se imagina — desde que exista vontade política, apoio técnico e capacitação institucional.

O Instituto Arapyaú, por meio do Programa Cidades e Territórios, desenvolveu um projeto piloto com foco no fortalecimento das capacidades institucionais dos governos locais. O resultado da iniciativa foi o lançamento de um material que reúne ferramentas e aprendizados práticos para apoiar prefeituras na construção de uma administração mais eficiente, sustentável e centrada nos cidadãos. Como parte do projeto, uma pesquisa conduzida pelo Plano CDE ouviu 120 gestores públicos e entrevistou 15 especialistas para entender melhor as percepções sobre inovação nas gestões municipais. Os dados revelam uma transformação silenciosa, mas significativa:

● 46,7% dos gestores usam tecnologia para otimizar projetos e processos;

● 26,7% buscam maior eficiência financeira no gasto por beneficiário;

● 23,3% focam na melhoria dos serviços públicos com foco no usuário;

● 3,3% investem em novos serviços, como Wi-Fi público.

Esses números reforçam que a inovação já está em curso — muitas vezes impulsionada pela própria burocracia, que se tornou motor para a criação de soluções mais ágeis e acessíveis.

Passado que ainda pesa

Apesar dos avanços, a ideia de que o serviço público é atrasado em relação ao setor privado ainda persiste no imaginário coletivo. Essa percepção vem de um histórico de entraves: filas intermináveis para matrículas escolares, agendamentos médicos presenciais e processos que exigiam pilhas de documentos físicos. Mas, aos poucos, esse cenário começa a mudar. Hoje, práticas como o agendamento online, o uso do CPF como chave única para acessar serviços e a digitalização de processos já fazem parte da realidade de diversas prefeituras. E o Brasil não está mal posicionado nesse processo: ocupa o segundo lugar no ranking mundial de governo digital, segundo o Banco Mundial.

Soluções acessíveis e replicáveis

A inovação também está se tornando mais acessível graças a instrumentos legais e modelos de contratação flexíveis. Um exemplo é o Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), que permite testar novas tecnologias por até um ano, com segurança jurídica. Com um teto de R$ 1,6 milhão (ajustável conforme a realidade local), esse modelo já foi adotado por cidades como Maceió (AL), Porto Alegre (RS) e Guaramiranga (CE), além de instituições como Petrobras, Caixa e Banco do Nordeste. Esses contratos estimulam o setor público a experimentar soluções de startups e empresas tecnológicas, oferecendo respostas mais eficazes e menos burocráticas a problemas antigos, como a fiscalização urbana e o atendimento ao cidadão.

Um dos principais símbolos dessa transformação digital no setor público é o portal Gov.br, que centraliza milhares de serviços federais em uma única plataforma digital. Criado para facilitar o acesso da população a políticas públicas e burocracias administrativas, o Gov.br já é um dos sites mais acessados do Brasil e tem sido fundamental para reduzir a necessidade de deslocamentos presenciais e filas. Com ele, é possível realizar desde a solicitação de documentos até o agendamento de atendimentos e o acompanhamento de processos, usando o CPF como chave única de acesso. Essa simplificação não apenas otimiza a rotina do cidadão, como também representa um salto de eficiência para a gestão pública, servindo de inspiração para que prefeituras em todo o país adotem soluções semelhantes em seus próprios sistemas.

Futuro digital e participativo

A tendência é que a inovação avance para além das áreas prioritárias, como saúde, educação e segurança, e atinja todas as esferas da administração pública. A expectativa é de que tarefas simples, como solicitar segunda via de documentos, se tornem 100% digitais. E o uso de tecnologias como inteligência artificial já começa a aparecer em algumas secretarias, otimizando tarefas e diminuindo a margem de erro. Esse futuro, no entanto, depende de um fator decisivo: a capacitação dos servidores públicos. Assim como foi necessário aprender a usar computadores e sistemas, será preciso investir continuamente na formação técnica e digital dos profissionais da gestão pública.

*Luiz Costa é Gerente de Inovação da Dome Ventures.


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