Para monitorar o funcionamento do transporte público do Rio de Janeiro durante temporais, o painel mapeia em tempo real os pontos de alagamento na cidade e faz uma contagem dos ônibus cujo trajeto inclui vias interditadas.

Com isso, os gestores da frota de ônibus da cidade, composta por 6 mil veículos, têm a possibilidade de analisar antecipadamente as linhas mais afetadas e tomar decisões mais ágeis.

“Geralmente, em situações de chuvas, os gestores não dispõem dessas informações para tomar decisões rápidas. O painel possibilita visualizar minuto a minuto os trajetos e a localização dos ônibus e identificar as vias interditadas”, afirmou Cardoso.

Pontos de lentidão e acidentes

Sistema semelhante, sem a funcionalidade de monitorar pontos de alagamento, já é usado desde 2016 pela Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes de São Paulo para gerenciar a rede de transporte público da cidade, uma das mais complexas do mundo, composta por mais de 1,3 mil linhas e 15 mil ônibus.

Para isso, o painel mostra a velocidade em tempo real dos ônibus em qualquer via, correlacionando os dados de GPS dos sistemas de rastreamento usados pelas empresas para localização dos veículos com informações sobre o trânsito e estatísticas da rede de transporte público.

“O sistema permite que os gestores do transporte público de São Paulo identifiquem antecipadamente pontos de lentidão na cidade, além de detectar velocidades abaixo do esperado de uma linha para um determinado horário e ocorrências que interferem no trânsito, como acidentes”, explicou Cardoso.

O monitoramento contínuo gera dados por meio dos quais os gestores públicos podem fazer estudos comparativos, abordando pontos como o impacto no trânsito com a implantação de faixas e corredores exclusivos para ônibus na cidade.

“Temos dados sobre a velocidade média dos ônibus na cidade de São Paulo desde 2015. Com base nessas informações, os gestores podem avaliar a eficiência de novas faixas e corredores exclusivos para ônibus e tomar decisões de mantê-los ou alterá-los de forma mais embasada”, avaliou Cardoso.

Mudança de rota

Empresa voltada à análise de dados para cidades inteligentes, a Scipopulis foi fundada pelo pesquisador em parceria com o cientista da computação Julian Monteiro e o urbanista Ivo Pons em 2014, após Cardoso concluir um doutorado na França, onde iniciou um projeto também voltado ao monitoramento do transporte público em Paris.

Ao observar as manifestações que começaram a acontecer em junho de 2013 nas principais capitais do país, originalmente para contestar os aumentos nas tarifas de transporte, os pesquisadores identificaram uma oportunidade de aplicar os avanços em inteligência artificial para resolver problemas de mobilidade urbana.

“As manifestações deixaram muito claro que o sistema de transporte público no Brasil era ruim, caro e não atendia às necessidades da população”, disse Cardoso.

O projeto inicial da empresa era desenvolver um aplicativo para smartphones que ofereceria aos usuários de transportes coletivos em São Paulo informações em tempo real sobre a localização das frotas de ônibus.

Apesar de inovadora, a solução chegou ao mercado simultaneamente à de concorrentes que garimpam informações no mesmo banco de dados mantido pela Prefeitura de São Paulo, que detalha a posição, minuto a minuto, de cada um dos mais de 15 mil ônibus que circulam pela cidade.

“Percebemos que havia muita concorrência nesse mercado e que teríamos de ter um volume muito grande de usuários e identificar outras fontes de remuneração para termos algum faturamento”, disse Cardoso.

Ao participar do Programa de Treinamento em Empreendedorismo de Alta Tecnologia (PIPE Empreendedor), da FAPESP, os fundadores da empresa identificaram que a tecnologia que vinham desenvolvendo também poderia ser útil para gestores do sistema de transporte das cidades.

Com base nessa constatação, desenvolveram o sistema para gestão de transporte público em médias e grandes cidades, batizado de “Painel de ônibus”.

“Os gestores, geralmente, não conseguem identificar muito claramente onde estão os gargalos de lentidão ou se as empresas estão cumprindo os contratos. A partir dos dados disponibilizados pelas próprias prefeituras organizamos, estruturamos e analisamos essas informações de modo a gerar estratégias para melhorar o desempenho da rede de transporte público”, explicou Cardoso.

Ampliação de mercado

Em agosto de 2019, a Scipopulis foi adquirida pela green4T, do ramo de infraestrutura digital, pelo valor de R$ 11,5 milhões. A aquisição foi o primeiro investimento em venture capital da empresa, que constrói data centers e salas de monitoramento para cidades.

“Eles constroem toda a infraestrutura de computação, mas não tinham o software para operar esses equipamentos”, disse Cardoso. “A aquisição possibilitou complementar a oferta deles com a parte de informação e nos deu a oportunidade de escalonar nosso modelo de negócios para desenvolver novas soluções focadas em cidades inteligentes, como monitoramento de segurança pública”, avaliou.

Após passar pela experiência de receber financiamento do PIPE e de venture capital, o pesquisador avalia que as duas modalidades de investimento em empresas iniciantes de base tecnológica têm suas peculiaridades e são complementares. “O PIPE não desempenha o papel do venture capital e vice-versa”, disse.

Em sua opinião, os recursos do PIPE são especialmente importantes na fase inicial da empresa, quando ela está começando a desenvolver um produto e não tem um valor estimado muito bem definido – o valuation, no jargão do mercado. Por isso, dificilmente conseguiria obter até R$ 1 milhão de capital de risco a fundo perdido como oferecido pelo PIPE, avalia o pesquisador.

“O PIPE financia a inovação. Os recursos permitem criar a empresa e testar ideias que, se tiverem mercado, podem resultar no desenvolvimento de um novo produto”, analisou Cardoso. Já o venture capital, acrescentou, permite às startups em estágio mais maduro financiar a escala do produto para que atinja novos mercados e tenha outras aplicações.

“É difícil conseguir acessar venture capital para criar um produto novo do zero. Normalmente, para isso o produto já tem que estar pronto para ser escalonado. Por isso o PIPE é fundamental”, afirmou.

Fonte: Agência FAPESP

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